sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

ENTREVISTA - Susana Ferreira, Xadrezista e Engenheira Civil

Susana Ferreira, é para mim um grande prazer poder contar com esta entrevista no meu blogue. Já nos conhecemos há bastantes anos mas começamos a falar mais regularmente após o Campeonato Nacional de Jovens de Xadrez, em 2003, em Aveiro. Já vivi na tua cidade, Aveiro, já entrevistei o Daniel Santinhos, que também vive lá, mas vens regularmente ao Porto; desta vez, vai o Porto ter contigo nesta entrevista. Estou a escrever um artigo sobre a falta de mulheres no xadrez e este será um dos tópicos que vamos abordar... mas não só!


HIGH ON THE MOUNTAIN:
Vamos começar com uma questão fácil. Como começaste a jogar Xadrez?

Susana Ferreira: Olá Morais! É para mim um privilégio escrever para/no teu blogue, que acompanho há tanto tempo!
Conhecemo-nos neste meio do Xadrez, por isso parece bem começar por explicar como me iniciei nesta modalidade; acaba por ser caricato! Costumava passar férias com os meus pais e com os meus irmãos. Num Verão, a casa onde estávamos não tinha televisão (a minha irmã deveria ter uns 9 anos, eu 6 e o meu irmão 5). Para nos entreter, o meu pai comprou um jogo de xadrez! E não é que passámos as férias a jogar?! Hoje em dia, dizem que as crianças não devem estar tão ligadas às “novas tecnologias” mas na altura foi como um “recurso” à televisão… Que passou a ser parte da nossa vida! Quando começou o ano lectivo, o meu irmão entrou no clube de xadrez “O Primeiro Passo”, e mais tarde eu e a minha irmã também nos juntámos ao clube. Desde então, o Xadrez não nos deixou mais em paz! :)

Campeonato Nacional Universitário, Vila Real, 2013.


HOTM:
O que mais te atrai neste jogo/arte?

SF: Pergunta difícil… Uma das principais coisas de que gosto, é de me sentar e concentrar-me no jogo, é como se entrasse noutra realidade... Encontrar soluções para o que vejo! Claro que não consigo deixar de parte a beleza que esta obra de arte envolve: ver planos, estratégias de uma boa partida de Xadrez, é maravilhoso! E o bichinho do Xadrez? Esse, que faz com que o coração bata mais forte por esta modalidade?!... Também é inspirador! Ainda por cima, o xadrez, está em todo o lado; é um padrão, é uma prisão, é um mote publicitário que dá que falar, aparece em imensos filmes/séries (desde Harry Potter a 007; passando pelo Dr. House). “Quem vence um jogo de xadrez? Quem comete o penúltimo erro”.


HOTM:
Quais os teus objectivos pessoais como Xadrezista?

SF: Já tive os objectivos xadrezísticos mais presentes na minha vida, agora já me sinto velha ehehe. Posso apenas dizer que gostava de perceber mais deste maravilhoso Jogo?! Acredito que assim, mais cedo ou mais tarde, os resultados/subidas de elo/participações internacionais simplesmente aparecem... Mas não nego que deixar de ver o dígito (1) da casa dos milhares, era sempre bom!


HOTM:
Por que há tão poucas mulheres a jogar Xadrez? E como se pode "chamar" as mulheres para o nosso desporto?

SF: Debato-me com essa questão há muito tempo... Pessoalmente e de forma sumária, vejo aqui 3 factores a considerar: as mulheres, os Xadrezistas do meio e a sociedade! Creio que mulheres que se interessam jogam; independentemente de haver prémios/campeonatos em separado (o que sinceramente ainda é algo que não consigo perceber bem...), “quem gosta, gosta sempre”. Se há menos mulheres, o nível xadrezístico (analisando unicamente o rating “ELO”) é menor; o que parece também ser natural... Mas o interesse em jogar xadrez tem que partir da mulher... Ninguém quer obrigar ninguém a nada, certo?! Questões do foro “psíquico”, não me cabe a mim opinar, mas deixo-vos 2 links com discussões sobre isso, com 2 dos maiores xadrezistas de sempre: Nigel Short (http://www.telegraph.co.uk/culture/chess/11548840/Nigel-Short-Girls-just-dont-have-the-brains-to-play-chess.html) e Judit Polgar (http://time.com/3828676/chess-judit-polgar-nigel-short-sexism/) [cliquem nos endereços que vão lá ter]. Depois, os Xadrezistas são maioritariamente homens. E como sou mulher, percebo que por vezes algumas situações possam não ser as mais confortáveis do mundo, por haver outro tipo de tratamento por parte dos homens... Isto não ajuda a que as jogadoras se sintam bem durante os treinos/torneios. Acho engraçado - e não me choca, (in)felizmente - como se vê na internet imagens de mulheres (com pouca roupa) e tabuleiros de Xadrez; partilha de fotos nas redes sociais de mulheres bonitas que jogam xadrez; listas com rácio beleza/ELO... e de homens, é mesmo difícil encontrar algo semelhante sequer! Sim sim, já fiz essa pesquisa, para contrapôr isto, mas não encontrei nada de relevante... Por fim, acho que a sociedade ainda não está como a queremos. Embora ache que isto está a ser ultrapassado ao longo dos anos, penso que ainda não é visto de igual forma que uma mulher jogue xadrez, comparativamente ao homem: que estude xadrez; que vá jogar torneios, sozinha; que dispense tempo para este desporto... Esta visão “quadrada” atrasa o desenvolvimento e a abertura que existe para a evolução na modalidade, sendo mais flagrante numa idade mais jovem. Para trazer mais mulheres, não encontro uma fórmula mágica: talvez, quando não se pensar nestas coisas/quando se agir em conformidade perante todos, “isto” avance e comecem a jogar mais mulheres. Falar em publicitar o xadrez, como resposta genérica, não se aplica só à mulher, mas sim a toda a gente...

Sobre este tema, o meu artigo no blogue do Opening Master:


HOTM:
Recentemente foi criado um dress code para Xadrezistas! Que comentário te merece este facto?

SF: Quando li, senti-me revoltada... E deixo aqui o link oficial do que estamos a falar: www.fide.com/images/stories/NEWS_2013/FIDE/Proposal_of_Ms._B._Marinello_in_respect_of_the_dress_code.pdf. Talvez tenhamos sorte e não obriguem os Xadrezistas a usar uniforme! Acredito que tenha sido uma medida mais direccionada para as mulheres... e se isto ajuda a que mais mulheres joguem xadrez? Seguramente não! Confesso que tenho sempre algum cuidado para não ir demasiado informal quando vou jogar xadrez, mas é uma questão de respeito que tenho perante a modalidade! :) Ver, no “dress code” dos Xadrezistas, problemas (e acredito que já os tenha havido) é exacerbar as questões de género; o sexismo; etc. etc. ...


HOTM:
Já te sentiste, ou sentes-te, discriminada por seres mulher e Xadrezista? Ou, por outras palavras, o Xadrez é sexista?

SF: Há campeonatos internacionais separados absolutos e femininos. Prémios nos torneios para a melhor feminina! Isto não fala por si só? Atenção que neste caso é discriminação “positiva”, que também não acho propriamente justo... Acredito que não é por aí que jogam mais/menos mulheres. Como referi acima, creio que a igualdade é o caminho. Fica aqui um link com uma pequena história de uma jogadora de xadrez e os seus problemas: http://fanoudraws.tumblr.com/post/68091072768/sorry-this-post-is-so-long-open-images-in-new.


HOTM:
Houve, há uns meses, o primeiro campeonato de Xadrez das universidades europeias. Já foste Xadrezista e universitária. Por que tantos xadrezistas deixam de jogar Xadrez ao chegar à universidade?

SF: Eu tentei sempre ir conciliando as duas coisas, mas muitas vezes não é fácil... É outra fase das nossas vidas. Deixamos de ser jovens, a motivação de ser um “sub” desaparece, tornamo-nos séniores e “pior”: adultos com outras responsabilidades (e outros interesses)... Mas habitualmente a universidade dá trabalho; para além de dar trabalho, é cansativa. Os torneios de xadrez, nomeadamente lentas, ocupam dois fins-de-semana seguidos... ou mesmo que ocupem só um; é um fim-de-semana “só para aquilo”! Muitas vezes trabalhos ou estudo/outras actividades dificultam que se prioritize o Xadrez, que é tão absorvente! Desta forma, creio que é compreensível que se abrande o ritmo durante esses anos... Contudo, nas férias pode-se jogar sem preocupações. Acrescento: trabalhando fica ainda mais difícil... Ainda me ando a habituar à mudança de vida de estudante para trabalhadora! Porque, apesar de tudo, existe outra flexibilidade enquanto estudante, em termos de horários e “semi-obrigações”. Eu senti que tinha ligeiramente mais controlo sobre o meu dia-a-dia, coisa que como trabalhadora geralmente é difícil... Em contrapartida, as férias podem ser quando quiser e podem ser marcadas consoante torneios (que dantes calhavam seeempre em épocas de exames da universidade!).

Campeonato Mundial Universitário de Xadrez, Guimarães, 2012.


HOTM:
E será que este novo torneio poderá ajudar a combater esse problema?

SF: Oh, não acredito. Sou a favor da existência de mais provas, claro, mas não é um único torneio que vai mudar isso... E, geralmente, “são quase sempre os mesmos” nesse tipo de torneios. Talvez divulgue a modalidade na universidade onde se realiza e traga mais jogadores! Também existem os torneios da FADU [Federação Académica do Desporto Universitário] e não é por isso que a situação se altera... Para colmatar este problema... Hmmm... o ideal seria regimes mais flexíveis para quem quer jogar! :)


HOTM:
Por falar em problemas, actualmente representas o GDDF (Grupo Desportivo Dias Ferreira). Não há clubes de Xadrez em Aveiro? Ou quiseste representar um clube melhor?

SF: Existem clubes de Xadrez, ligeiramente mais direcionados para jovens, mas também há adultos! Gostava de jogar por equipas e isso fez-me procurar um clube maior, em que fosse mais fácil fazê-lo. Conheço o Vitorino (diretor do Grupo Desportivo Dias Ferreira) quase desde que me lembro de entrar para o xadrez, então senti que só seria benéfico para mim, mudar de clube. Pelos meus resultados por equipa, talvez o clube não ache o mesmo ehehe.


HOTM:
O GDDF ganhou o Campeonato Nacional de Xadrez em 2013/2014 e ganhou as duas últimas edições da Taça de Portugal (2013/2014 e 2014/2015)? Eu, que sou formado no clube, senti com grande emoção estas conquistas. Vinda de "fora", e sabendo que pelo menos o Campeonato Nacional era algo inesperado, qual foi a sensação destas vitórias?

SF: Fiquei contente, claro. Mas honestamente sinto mais contentamento pelos resultados do grande jogador Jorge Ferreira [perfil na FIDE], nesses campeonatos! Actualmente, os campeonatos, apesar de se denominarem “nacionais”, por vezes pouco têm de nacional - especialmente num nível mais alto. Mas deixo este tema para futuras discussões!


HOTM:
Por falar em discussões... És sportinguista, o que confirma que ninguém é perfeito. O GDDF venceu a última Taça de Portugal ao Sporting, precisamente. Por quem torceste na final?

SF: Aahahah não é o facto de ser sportinguista que me leva no caminho da imperfeição! :) Na verdade, sou Beira-Marense desde pequenina... É o clube da minha cidade! Mas o GDDF é o meu clube de Xadrez, não poderia estar a torcer por outro; mesmo desejando todas as vitórias possíveis ao Sporting!

A segunda Taça de Portugal consecutiva do GDDF.


HOTM:
Vitorino Ferreira 1 - Bruno Carvalho 0. Vitorino Ferreira, o Presidente do GDDF, cuja entrevista neste mesmo espaço está preparadíssima há longos meses e à espera de uma resposta, é por muitos apelidado o Pinto da Costa do Xadrez. O Sporting tem um bom presidente? É bom ser um personagem interventivo e atento ou alguma moderação ser-lhe-ia benéfica?

SF: Julgo que ser apelidado de “Pinto da Costa” nunca pode ser bom! Mas sim, percebo a analogia, pois pelo menos no Norte do país, não existe ninguém tão emblemático como o Vitorino. Bem, o Bruno de Carvalho é um verdadeiro Sportinguista. Começou por conseguir fazer novas eleições; renegociou dívidas; mexeu no clube! Agora, trouxe o Jorge Jesus (ainda estou reticente)... E apesar de estar quase a ser campeão de Inverno (que é pouco indicativo, remetendo ao passado), a verdade é que devolveu alguma esperança aos Sportinguistas, muito por ser interventivo! Até eu ando a pensar fazer-me sócia “num minuto” (passo a publicidade https://socionumminuto.pt/). Na minha humilde visão, ele exagera um bocado. Querer punir sócios por escreverem mal do Sporting nas redes sociais?! Responder sempre a insultos/picardias (e por vezes bastante ressabiado!), acho demasiado... Devia conseguir conter-se para não “dizer tudo o que lhe apetece”.


HOTM:
O Sporting andou desaparecido do Xadrez nacional durante anos. Pelo menos, dos grandes palcos. Já estivemos na Direcção da AXP (Associação de Xadrez do Porto) e sentimos algumas dificuldades em encontrar as pessoas certas para as necessidades da modalidade. És de Aveiro e jogas em Matosinhos. Tudo isto reflecte algumas dificuldades que o associativismo enfrenta actualmente?

SF: Será que o associativismo não esteve sempre em dificuldades?! Começo a acreditar que também existe o “bichinho” do associativismo, que nos leva a querer fazer outras actividades/novos projectos, mais e melhor, também a pensar nos outros. Apontaste um ponto importante: encontrar as pessoas certas! Somos todos diferentes, com características distintas; não faz sentido todos executarmos as mesmas funções no associativismo. Para mim, isso é das situações mais complicado de “lidar”... Confesso que sinto falta de ter o associativismo na minha vida. Tenho que criar um clube ou organizar um torneio ou algo assim; desde já estás/estão convidados! :)


HOTM:
Obrigado. Agora, vamos reflectir sobre estes últimos 4 anos que foram marcados pela emigração de jovens, alguns deles Xadrezistas, austeridade que também afectou o associativismo, cortes na investigação e desenvolvimento tecnológico... A austeridade parece-me jogar à defesa; o investimento parece-me ganhar iniciativa após sacrificar material. Falta estratégia na política? Faltam estrategas/Xadrezistas?

SF: A austeridade jogou “bem” ofensivamente nos últimos 4 anos... Eu acho que até houve estratégia, mas não foi centrada nas/para as pessoas. Vejo a política como um conjunto de estrategas, que aparentam ter todos diferentes objectivos e cada um a puxar para seu lado. Agora... Se faltam alguns estrategas como o Magnus Carsen (melhor jogador de Xadrez de todos os tempos http://magnuscarlsen.com/) que vejam um pouco mais além e que realmente ajudem a levar isto para a frente? Talvez!


HOTM:
O Xadrez faz falta como desporto escolar?

SF: Noutros países mais evoluídos, o Xadrez escolar é obrigatório. Deveríamos caminhar nesse sentido (e não o oposto, de acabar com ele como tem acontecido...). Acredito que o desporto escolar deve auxiliar esse processo de implementação e manutenção do Xadrez escolar! Recordo-me sempre de jogar o campeonato nacional de desporto escolar, onde estavam imensas crianças com idades próximas da minha! Íamos com colegas que frequentavam a mesma escola, jogar um dia inteiro noutra escola qualquer no país! Boas memórias de dias bem passados. Concluo dizendo que não tenho dúvidas de que o Xadrez é benéfico para a formação das crianças e para o desenvolvimento de capacidades relacionadas com o cérebro.

I Torneio Imperial de Aveiro, 2014.


HOTM:
Por falar em formação, és Engenheira Civil. Estás em Portugal. Exerces na área. Como está a Engenharia Civil em Portugal? É fácil arranjar emprego? Há perspectivas de carreira?

SF: Acho que já esteve pior, mas continua muito mau... Não é fácil ter uma primeira oportunidade; normalmente quem a consegue, prossegue e fica com algumas perspectivas de carreira. Mas não é um cenário nada ideal... Talvez as coisas dêem a volta, mas não tenho muita fé que isso seja para breve. A Engenharia Civil é muito abrangente e vejo que muitas vezes é esquecido pela sociedade (em particular pelas entidades empregadoras), que temos muitas valências que estão a ser subaproveitadas! E depois há outro factor: mesmo tendo essa polivalência é importante fazer-se o que se gosta. Eu estou feliz a nível laboral, mas vejo que é muito complicado encontrar oportunidades “ideais”.


HOTM:
Com certeza que muitos colegas teus já emigraram. Emigrar é uma necessidade ou uma opção?

SF: Acho mesmo triste tratar-se de uma necessidade; deveria ser sempre uma opção! Actualmente, se se deseja ter um nível de vida um bocado superior, sendo jovem, talvez seja uma necessidade obrigatória emigrar... Mas mesmo para arranjar estágio (e trabalho!), vejo que colegas de curso têm tido alguma dificuldade; mesmo com medidas “mediadoras” do IEFP... A que ponto as coisas chegaram!


HOTM:
Quando se fala em Engenharia, todos os créditos são dados à FEUP. A Universidade de Aveiro está em franca evolução, contudo. Do que conheces, talvez por discutires com colegas de ambas as faculdades, a FEUP é realmente melhor ou achas que ainda vive muito duma fama criada à volta da UP que se vai desvanecendo?

SF: Inicialmente, (e permite-me a correção?!) creio que os créditos eram todos dados ao Técnico, em Lisboa. Com o decorrer do tempo, o paradigma foi-se alterando, a FEUP foi ganhando notoriedade e mais recentemente, há mais faculdades/universidades marcadas no mapa a nível internacional. Relativamente à Universidade de Aveiro, quase diariamente saem notícias de novas descobertas tecnológicas e científicas; da FEUP não sei, mas sobre a UA continua a haver muitos motivos de orgulho! (Isto é apenas uma pequena picardia, pois assumo que defendas a tua UP).


HOTM:
Sobre a UP haveria muito a falar... Consideras abandonar o xadrez, eventualmente por motivos pessoais ou profissionais ou gostarias de jogar para sempre? Achas que é realista e compatível o equilíbrio xadrez/vida pessoal?

SF: Não sei o futuro, mas sinto que o xadrez já faz parte de mim. Considero que faz parte da minha vida pessoal! Mesmo se eu formar família, quero continuar a jogar. Acho que tudo é possível, basta equilibrar essa balança. Em todos os torneios que vou jogar, o que me costumo lembrar mais são as histórias que acontecem; o convívio, as pessoas; o local; as particularidades do torneio! É isso que levamos connosco, “after all”.

Em Barcelona.


HOTM:
Para acabar, que a entrevista vai longa, conta-nos uma história que recordes com particular emoção sobre a tua vida no xadrez. Essas histórias, como bem sabes, abundam no GDDF...

SF: Talvez possa apenas dizer que num dos primeiros torneios que fui jogar (que felizmente ainda se realiza!) em Cucujães, joguei com o Vitorino. Lembro-me que estava melhor, mas acabei por perder – que é tão comum... (Diz-se que os jogos mais difíceis de vencer, são os jogos onde estamos melhor!). Recordo-me sempre que o Vitorino disse-me que se notou que tive uma quebra de energia, que deveríamos sempre comer algum docinho a meio dos jogos. Não é uma história emocionante, mas foi uma lição para a vida!


HOTM:
Muito obrigado pela entrevista. Se quiseres deixar algum comentário final, está à vontade; no meu blogue não há limites editoriais!

SF: O Xadrez enriqueceu e enriquece a minha vida. Espero que todos tenham hipótese de sentir algo semelhante, por um “hobby”. Que façam amizades (e inimizades, também é preciso ehehe) com pessoas de todo o país e de todos os lados do mundo, que tenham histórias para contar! E, possivelmente, se não fosse o xadrez não nos tínhamos conhecido! :) Espero que te/vos dê tanto gosto a ler a entrevista como eu tive a escrevê-la!

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Cago e mijo e azio e vomito

Quando me dá vontade de cagar
também sou capaz de largar urina,
e tendo tempo faço-o devagar
pois gosto de meditar na latrina,
e fumar, abstrair-me e divagar,
bater uma a pensar numa menina,
limpar, tanto a mim como este lugar,
e reflectir no que a mente ensina...

Merda e mijo, tanto e tão belo,
castanho escuro/ácido amarelo,
o mundo tão podre caiu-me no goto
e só me livro dele... a cagalhoto!

Fico enfartado de tanta hipocrisia,
lágrimas de crocodilo, astúcia, manha,
o ácido sobe e não aguento a azia,
quero vomitar o que o corpo estranha,
meto dois dedos como o povo bem dizia,
na boca aberta que a taxa arreganha,
o vómito surge e o estômago esvazia,
fora de mim quem mal me acompanha!

Azia e vómito, tanto e tão belo,
cinzento, castanho, verde, amarelo,
o mundo tão podre caiu-me no goto
e até o regurgitar renovava o arroto!

Cago e mijo e azio e vomito
e dizem que não é bonito?
Querem que fique comigo
o excremento dito amigo?
Devo fortalecer amizade
com quem de me foder há-de?
A idiossincrasia é o que me resta,
livrar-me de tudo o que não presta!

Pessoas, pessoas e... pessoas,
tanto muitas más como poucas boas:
mentira, farsa, rancor e traição,
os alimentos da minha excreção...





segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Sobre os resultados das eleições legislativas de 2015...

Vou deixar aqui o meu comentário aos resultados das eleições de ontem. O que me apetece é mandar os portugueses à merda, a maioria dos portugueses, como é óbvio, que há sempre boa gente e má gente em todo o lado. Mas não vou mandar os portugueses à merda, vou dar os parabéns por acreditarem que estão no bom caminho. Eu não acredito... Também podia dizer que o povo é medíocre e estúpido, inculto e mal formado mas também me vou escusar de dizer isso porque, no fundo, a culpa disso nem é do povo, é dos políticos que se aproveitam dessa mesma ignorância que lhes é favorável... De igual modo, parecer-me-ia relevante salientar o carácter masoquista do povo, nomeadamente o culto sodómico, mas se o povo tem como um dos últimos prazeres baixar as calças, votar nos mesmos e persignar-se enquanto suporta a dor divina, só lhes posso louvar a fé. E, acima de tudo, o que tenho a dizer é que não tenho qualquer moral para criticar o bom povo português apenas porque sou bastante diferente da maioria deles. Por isso quando criei este blogue chamei-lhe como lhe chamei, já então gostava de estar no cimo da montanha a apreciar a desgraça que grassava no vale... Assim como se poderia chamar "alone in the island", e então imaginar-me-ia numa ilha distante a ver a desgraça no continente. Mas estou cá no meio, voto diferente de vós, maioria, admiro as nossas diferenças e tento ser aquele que se contenta em apreciar o espectáculo do mundo...

Está dito mas ainda posso acrescentar umas reflexões. O PAN elegeu um deputado: óptimo! Foi das minhas poucas alegrias de ontem. É pena só ter sido um, quando há mais 229 lugares que estão ocupados pelos mesmos de sempre. Ainda assim, há dois partidos que por não terem ainda experimentado o poder merecem esta ressalva. De resto, das 16 cruzes possíveis (nem o Totobola tem tantas linhas...), curiosamente só agora reparei na força da palavra cruzes mas avancemos, 11 não merecem ser alternativa às alternativas que o povo pede; curioso... Claro que por exemplo, havia um partido que achava imensamente e particularmente redutor (além da coligação vencedora, entenda-se), o PURP (Partido Unido dos Reformados e Pensionistas). Redutor porque o país é muito mais do que reformados e pensionistas, e na verdade acho que a nação precisa de sangue novo... O PURP teve 0,26% dos votos... Os diferentes movimentos de cidadãos, que acho extremamente louváveis (mesmo o PURP, pois prefiro a acção à apatia), não conseguiram captar os votos que mereciam pois lutavam, logo à partida, com forças desiguais. O povo, que tanto se chora e critica os políticos, nomeadamente os carreiristas, gosta de os eleger quando tem o poder de não o fazer. Aqui do alto da montanha vejo nevoeiro no vale mas um céu limpo à altura dos meus olhos... Os pequenos partidos e movimentos de cidadãos (que não são partidos políticos, felizmente) conseguiram mais de 5% dos votos. O meu conselho é que além dos partidos que têm, doravante, lugar no parlamento, que se forme apenas mais um partido (ou movimento), e que se lhe chame Tudo o Resto! Penso que, apesar da feliz excepção PAN, é o modo de alguém diferente entrar no parlamento pelo sufrágio.

Falando dos de sempre (surgiu-me o adjectivo escumalha mas vou escusar-me a usá-lo), e começando pelos da ressalva, a CDU teve mais um deputado do que da última vez e perdeu, segundo os entendidos, e o BE teve uma estrondosa vitória e passou a terceira força política (depois da coligação e PS). PAN, eles quando lá chegaram nem meia dúzia eram... A coligação perdeu a maioria e venceu as eleições e o PS perdeu as eleições e ganhou deputados. Há sempre muitas maneiras de ver a mesma questão...

Aguardo cenas dos próximos capítulos pois sem uma maioria absoluta talvez seja difícil governar mas com este presidente da república tudo é possível, como se tem visto...

(Um parêntesis para dizer que o Vilhena deixa saudades...)

E por falar em República, foi implantada há 105 anos mas parece que já não é importante esse facto pois, primeiro, deixou de ser feriado e agora o presidente da mesma fez saber que nem a comemorará... Como Republicano que sou, e nesta República onde vivo, aqui no cimo da montanha é feriado e esta é a minha comemoração.


P. S. (post scriptum, para não haver dúvidas): a República apresenta-se com as mamas descobertas e talvez por isso não faltem mamões desde que aqui chegou; se a foto fosse mais recente, veríamos como desgraçada está a República, mais sugada que a puta que os pariu!