domingo, 14 de fevereiro de 2010

Manta morta...

Viam-se raios de sol a entrar pelos buracos do telhado. Faziam círculos na parede esverdeada, muscícola e liquenosa. Não, apenas muscícola. É esta a palavra? Tinha musgo! E havia folhas no chão. Folhas de árvores que se abanavam ao vento por ali perto. Algumas já bastante secas. Toda uma manta morta se estava ali a formar! As raízes... As raízes invadiam já o espaço, por entre as falhas no telhado. Também elas se interessavam pela manta morta! A vida alimenta-se da morte, não o contrário! Os mortos não se alimentam! Os vivos sim! Somos necrófagos! Sim, comemos mortos. Ou o galo costuma cantar na vossa cabidela?!
A morte estava ali. Cheirava a morte. O aspecto era de morte. Não a ouvi, contudo... Estavam a bater à porta... Não fui abrir. Podia ser a morte e não me queria encontrar com ela. Sentia-a tão perto...
Continuei a observar, à procura de movimentos. Encontrei-os. Larvas moviam-se furiosamente num crânio putrefacto de um pequeno animal. Um pequeno morto. Uma pequena morte? Não sei...
Ossos... Havia ossos no chão. Pequenos ossos. Grandes ossos. Pedaços de carne nos ossos. Pelos na carne. Pelos nos ossos. Larvas, carne, pelos, ossos. Morte. Uma manta morta cheia de vida. Da morte se faz vida! Não o contrário. A vida parasita a morte. A morte só quer viver a sua vida descansada... A sua morte! E havia medo no ar! E esse eu ouvia bem, sob a forma de silêncio! Medo de quê? Da morte? Essa não assusta ninguém com a sua inércia! Só a vida! As larvas cegas e revoltadas, as raízes penetrantes e desinibidas, todo um mundo microscópico, biológico, incógnito, assassino, assustador!

A manta morta vive...

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