segunda-feira, 13 de outubro de 2025

ENTREVISTA - André Fox, Músico e Terapeuta de Som

André Fox, é para mim um grande prazer poder contar com esta entrevista no meu blogue - sei que me repito nesta parte inicial mas é verdade. Já nos conhecemos há uns doze meses, uma volta ao Sol, fazes parte desta minha estadia em terras de Santa Maria da Feira, e também do meu percurso espiritual. Exerces por cá as tuas actividades, da música à meditação, passando pelos produtos naturais, e seguramente serão tópicos abordados nesta entrevista.


HIGH ON THE MOUNTAIN:
Vamos começar com uma questão fácil. Como chegaste à espiritualidade?

André Fox:
Olá Paulo, grato pela tua companhia nesta volta ao Sol, onde nos encontramos para vibrar mais alto. Desde miúdo que haviam coisas que não eram muito normais, digamos. A minha mãe contava histórias da infância/adolescência, que foi marcada por um grande dom, mas que na altura era problemático e então resolveram bloquear em certa parte as capacidades dela. Eu lá fui crescendo, ignorando o lado espiritual e deixei-me levar pela matéria, até que regressei de estágio em Espanha, Granada (2012) e algo cá dentro começou a questionar tudo e a tentar encontrar o propósito da nossa vinda cá a este plano. Não foi fácil, muito isolamento e horas passadas a ver documentários e a estudar coisas que não são bem vistas aos olhos da sociedade.



HOTM:
Já passaste pela indústria têxtil, pelo turismo, já foste DJ - encontraste na espiritualidade o teu caminho ou ainda poderemos assistir a mais alguma mudança radical na tua vida?

AF:
Radical não digo, quando uma pessoa se abre ao Universo, vamos complementado a nossa capacidade de servir a nós e ao próximo. 
Talvez num futuro irei estar mais próximo da terra e da produção de alimentos, é algo que gosto e que cada vez mais necessitamos.


HOTM:
Queres explicar melhor o que fazes actualmente em termos profissionais?

AF:
Para além de ajudar na limpeza energética, eu potencio o crescimento de quem me procura. Vejo para além da carne e da mente, vejo o potencial escondido dentro de cada um. 
Uso o Reiki para análise energética e o Som para proporcionar um  relaxamento profundo, que ajuda na cura da Alma e consequentemente do físico.



HOTM:
Lançaste recentemente a tua própria marca de instrumentos musicais, a Sana Sounds. Como está a correr? Que instrumentos vendes?

AF:
Sim, lancei a Sana Sounds, focada em instrumentos de qualidade alta a um preço muito acessível. 
Para já vendemos Handpans, Taças de Cristal, Taças Tibetanas, Gongos do Nepal. 
Posso afirmar que está a correr melhor do que o esperado, cada vez mais as pessoas têm consciência do poder do Som, o que é fantástico.



HOTM:
A tua actividade, como qualquer outra, tem os seus desafios. Ainda há muita gente que te ache um "bruxo", ou mesmo um charlatão?

AF:
Houve alturas em que perdi tempo em tentar mudar as mentalidades. Mas aos poucos a verdade vem ao de cima. 
Tive alguns episódios caricatos com pessoas conhecidas, mas não há nada melhor do que experienciar... 
O Som/Energia fala por si, é como o algodão, não engana hehe.


HOTM:
Podemos dizer que és um "terapeuta de largo espectro", creio. No que concerne aos produtos naturais, quais aqueles com que gostas mais de trabalhar?

AF:
Já experienciei e auxiliei rituais com medicinas da Amazónia, Ayahuasca, kambo, rapé. Também com psilocibina (cogumelos mágicos).  Mas há uma que me acompanha já há uns bons anos, que é a cannabis. Muito mal tratada pela sociedade, esta medicina ajudou-me imenso no meu despertar e a deixar uma droga pesada que quase me matou por várias vezes, chamada álcool.  De todas as medicinas que mencionei, é a mais fácil de vigiar em grupo, ainda assim é preciso total respeito pela planta e por aquilo que ela nos vai mostrar.



HOTM:
Porque há tanto preconceito com certos produtos, como os canabinóides, quando alguns outros parecem estar na moda, e ninguém põe o seu uso em causa? Não são todos os produtos naturais igualmente interessantes, apesar de cada um ter a sua própria utilização?

AF:
Eu acho que é claro, dizem que a cannabis deixa a pessoa preguiçosa, que destrói neurónios... Muito pelo contrário, já há estudos que comprovam que cria neurónios (usada para reverter Alzheimer, já comprovei com um paciente meu) e claro, quando estamos a trabalhar em algo de que não gostamos, a planta só vai mostrar cada vez mais esse desagrado, obrigando-nos a mexer. 
É uma planta que ajuda no despertar, e é claro que quem domina este Jogo, não quer perder escravos... 
A roda tem que girar, sem questões, sem desobediência...  Para além disso é uma planta que interfere com o nosso sistema endocanabinóide, responsável por tudo que é inflamação, tudo que é inflamação é doença... Claro que a indústria farmacêutica não iria aceitar perder bilhões em lucros com clientes, curar nunca foi rentável. Existe cura para tudo e encontra-se na natureza, estamos a ver cada mais estudos sobre psilocibina e outras "drogas", que retiram este carácter negativo, mas como sempre, é preciso muita cautela, segurança e respeito pela medicina.


HOTM:
Foste pai pela primeira vez o ano passado, e além dos desafios habituais da paternidade sei que evitas (ou negas mesmo a utilização?) de vacinas e outros produtos farmacêuticos e tratamentos tradicionais em detrimento de produtos naturais e terapias ditas alternativas. É difícil lidar com a medicina tradicional? É possível conjugar medicina tradicional com natural/holística?

AF:
Com a minha experiência posso afirmar que ir ao médico/hospital, só mesmo em emergências/acidentes. A partir do momento em que há formas holísticas de detectar doenças antes delas se manifestarem no físico para quê submeter a exames que são prejudiciais para o nosso corpo? Para quê estar num espaço cheio de viroses? Fui pai, a minha companheira não levou nenhuma vacina, nem a minha filha, passaram-se 16 meses e fez apenas febre ao nascer os dentes, nunca esteve doente. 
Li as bulas todas por descargo de consciência e ainda fiquei mais indignado com os efeitos, mas ninguém lê as bulas? Confiamos nos médicos de olhos fechados? O homem do talho também veste bata branca...
Para mim, que já ajudei a detectar cancros e ajudei a curar, não acho que a medicina tradicional tenha qualquer tipo de eficácia, remediar não é solução. É necessário saber a causa da doença e 100% das vezes ela antes de ser física já se manifesta no campo espiritual/mental/emocional.



HOTM:
Outro desafio é chegar às pessoas. Há muita gente disposta a experimentar estas terapias alternativas?

AF:
Cada vez mais, mas esperam que a terapia faça o trabalho deles. Muitos querem mudanças sem fazer algo diferente... São poucos os que experimentam e fazem pela sua própria cura/salvação, mas tudo a seu tempo.


HOTM:
Há um tipo de terapia para cada pessoa ou situação? Ou por exemplo o sound healing aplicar-se a todos?

AF:
Eu acho que é muito pessoal. Na minha visão o Sound Healing é para todos, é uma ferramenta para ajudar no desligar da mente e ver o que vai dentro da Alma. Mas acredito que haja terapias que ressoam mais com certo tipo de pessoas do que com outras e ainda bem. Não há errado nem certo, sentimos e é o suficiente. Só temos que nos deixar levar pelo que ressoa connosco.


HOTM:
És utilizador da IA na tua vida? Achas que a vida vai mudar muito com a inteligência artificial?

AF:
Se dependesse de mim, já teriam ido à falência hehehe. Usei umas poucas vezes.  Acredito que usada para o Bem de todos seria algo magnífico, um mundo mais criativo e despreocupado, mas com estas "gentes" a liderar o planeta, pressinto que será algo usado para um ditadura tecnológica, como na China.


HOTM:
Creio que concordarás que o Mundo não vai no caminho certo (alterações climáticas, guerras, várias tensões sociais, ...). Que caminho propões a aqueles que te procuram? É possível mudar o Mundo?

AF:
O que proponho é cada um encontrar a sua graça, fazer o que amam e servir o próximo. Só assim, mudando o interior, veremos a mudança no mundo. Está na hora.


HOTM:
Muito obrigado pela entrevista. Se quiseres deixar algum comentário final, está à vontade; no meu blogue não há limites editoriais!

AF:
Obrigado eu. Quero apenas felicitar-te, pelo teu crescimento, pelo teu trabalho.  Por teres aceite o convite do universo para seres a mudança que  o Mundo precisa.


sábado, 4 de outubro de 2025

As crónicas crónicas - pt. II - a caixa de correio

Encontrei um verdadeiro filão! Estou extremamente contente! Não é de ouro, ou estaria extremamente rico! Mas para crónicas, para as escrever, para me rir com estes momentos de ouro (em sentido figurado, claro), encontrei uma fonte que teima - felizmente - em não secar: a administração de condomínios. 

Era uma vez um condomínio. Estava a chegar a esta actividade, era jovem, tinha sonhos, gostava de contribuir com algo bom para a sociedade, mas não conhecia verdadeiramente este monstro que estava prestes a enfrentar! As pessoas, essa raça tão estranha, conseguem ser muito possessivas quando se trata da sua casa, como estavas prestes a descobrir! Conseguem transformar-se em verdadeiros monstros! Sim, vi pesadelos à minha frente, a surgirem do nada, de situações de nada, de somenos, lana caprina, o que lhe quiserem chamar, a tomar proporções quase bíblicas! Valha-me Deus! Nem Deus teria paciência para a profissão, nem o Diabo se deve ter lembrado de algo tão brilhantemente complexo e odioso! Desta vez, e haverá mais vezes, vamos focar-nos num tema que, parecendo pequeno, é de enorme importância, pelo menos para quem o levou à reunião daquela noite: a caixa do correio!

A tensão sentia-se no ar naqueles trinta minutos que distavam entre a primeira convocatória e a segunda - não havendo metade do quórum na primeira, espera-se que haja pelo menos um quarto (de quórum, entenda-se), na segunda, para se fazer a assembleia. O tema mais fracturante daquela noite foi uma caixa de correio! Eis o problema: a caixa de correio do condómino de então estava demasiado baixa. Mais ainda - descobri que a altura mínima para a colocação de uma caixa de correio é de cinquenta centímetros. Sim, porque o lesado, o condómino que reclamava desta situação, tinha já consultado um advogado para o efeito! E afirmava, com bastante segurança, que se a situação não ficasse resolvida naquela noite o caso seria mesmo resolvido pelo advogado! A altura de uma caixa de correio... Vê-se tanta fome, doenças e guerras no Mundo - situações confortáveis quando comparadas com meio metro de depósito de cartas, publicidade e afins, num século XXI onde a transição digital - entenda-se correio electrónico -, vai substituindo o papel. Mas se a Lei lhe assistia, o que dizer?!

Claro que a história já é boa só por si, mas ainda há mais a revelar: o condómino que não estava disposto a viver numa casa com uma caixa de correio abaixo do meio metro de altura legal estava emigrado, e disse: "Vim ontem de propósito de França para resolver esta situação!". Pelos vistos, faria uso daquela casa, e da respectiva caixa de correio, apenas uma a duas vezes por ano, apenas alguns dias. Primeiramente, e sem pensar muito no assunto, pareceu-me ridículo, mas um esforço de reflexão fez-me pensar em cenários nunca dantes alcançados: a caixa de correio era baixa, de facto, para se chegar ao fundo da mesma - e portanto ao fundo da questão - uma pessoa tinha de se ajoelhar. Ora, não é preciso ter fé para termos acesso ao lixo todo que por lá anda a maior parte do tempo - chamemos-lhe publicidade -, é preciso ter uma caixa de correio, alta, pois nem toda a gente se pode, ou se quer, sequer, ajoelhar. Caixa esta que deveria ficar muito atulhada destas resmas do consumismo sempre que a viessem consultar após meses de ausência. Há que perceber que qualquer questão tem sempre, e pelo menos, dois pontos de vista - este tinha a sua pertinência afinal! E colocar um daqueles autocolantes da "Publicidade aqui não"?! - sei lá, digo eu... Mas talvez tivesse de vir da França só para tratar disso, não parece razoável. Talvez gostasse da publicidade. Talvez fosse entusiasta da filatelia, e esperava completar a sua colecção de selos - esses pedaços de arte que já não abundam. Selos nas cartas sim, selos nas calças não - é compreensível.

A solução? Fácil, mudar a disposição das caixas de correio. Subi-las! Um trabalho simples, para quem dele percebe. Duzentos a trezentos euros para fazer uma pessoa feliz? Todos os problemas custassem tão pouco! Nomeadamente divididos por todos os condóminos, uma pechincha! Aprovado por unanimidade! Ajoelhou vai ter de rezar, não recolher a correspondência... O ar ficou limpo, a tensão desfeita, já não me lembro se o humano em causa ficou para o resto da reunião ou rumou de imediato para a terra d'Os Miseráveis, enfim, o seu objectivo estava atingido, e outros assuntos puderam ser debatidos. Administrei aquele condomínio por cerca de um ano mais, aguentei esta actividade pouco mais de três. Foi a minha segunda reunião como profissional mas foi aquela em que perdi os três, como se diz em bom Português, ainda que possa haver ali um pouco de sotaque estrangeiro. Uma caixa de correio baixa, nunca tinha pensado na importância de tal...



ENTREVISTA - Nuno Melo, Melómano e Mediador de Seguros

Nuno Melo, é para mim um grande prazer poder contar com esta entrevista no meu blogue. Já nos conhecemos há uns quatro anos, fazes parte desta minha estadia em terras de Santa Maria da Feira, onde és um dos melhores mediadores de seguros (não sou eu que digo, diz o tio Google, que é mais isento do que eu). De seguros, desta terra, e do mais que calhar, há espaço para tudo nesta entrevista.


HIGH ON THE MOUNTAIN:
Vamos começar com uma questão fácil. Como chegaste à mediação de seguros?

Nuno Melo:
Esta é uma longa história... Em 2005 a minha vida deu uma grande volta, a volta que mudou toda a minha vida. A minha namorada colocou-me uma questão importante e fundamental: "Vais continuar a estudar ou vais trabalhar?!". Na altura estava no segundo ano de Engenharia Electrotécnica, no ISEP,  na quarta ou quinta matrícula. E trabalhava em part-time no E.Leclerc. Na verdade tirei os cadeirões à primeira, análises matemática e físicas... já as práticas e a aberração de programação era um terror. Aproveitei o empurrão e desisti. A minha namorada era divorciada e tinha um filho de 5 anos, abriu-se a hipótese de emigração. Para mim nunca foi uma hipótese, só mesmo no limite. Para a minha namorada sim. Fui falar com a minha chefe da altura e foi-me oferecido o estágio para sub-chefe. Trabalhar das 6h às 14h na reposição, das 15h às 20h na formação, e depois trabalho mesmo como sub-chefe. Este belo horário deu em esgotamento ao fim de 8 meses. Férias forçadas e baixa médica. Em Setembro fui falar com a chefe para desistir e foi-me sugerido por ela ir uma entrevista na Mapfre de Gaia, para um projecto que estavam a lançar para gestores de seguros. O marido dela trabalhava lá. Fui seleccionado. No dia 16 de Outubro estava a apanhar o comboio para Lisboa, para uma formação de 3 semanas. E agora passaram quase 20 anos de actividade.


HOTM:
Se não morasses em Santa Maria da Feira, onde gostarias de viver?

NM:
Eu moro em S. João de Ver. Não gostaria de morar na Feira. Ou em Cortegaça, para estar mais perto do mar, ou em alguma aldeia da Serra da Freita, para caminhar na natureza.


HOTM:
Porque tanta gente continua a falar na "Vila da Feira" quando é cidade há mais de 40 anos [14/08/1985]?

NM:
Acho que são os mais velhos... mas mesmo a minha mãe, que acaba de fazer 70, já vive há mais anos com a Feira como Santa do que como Vila; é daquelas coisas difíceis de perceber.


HOTM:
És um aficionado da cultura, e felizmente está cidade tem vários eventos interessantes ao longo do ano (Viagem Medieval e Imaginarius, por exemplo). Queres destacar algum? E porquê?

NM:
Esqueceste-te do Perlim e da Festa das Fogaceiras. Eu gosto um pouco de todos. Irrita-me os Feirenses não gostarem, e muito mais alguns que nunca foram a nenhum. Ainda para mais o Imaginarius, que é de borla. Os de fora vêm cá de propósito, mais do que nós Feirenses. Sei que pode ser incómodo, mas traz dinheiro. Mas já sabemos que o tuga é mestre a reclamar de tudo.


HOTM:
Quanto às reclamações nunca me tinha apercebido... Vamos lá de novo: porque tanta gente chama "Feira Medieval" à Viagem Medieval? Será pela associação à "Vila da Feira"?

NM:
Porque começou como Feira Medieval. Malta de hábitos.


HOTM:
Sei que também gostas de literatura. O que estás a ler neste momento?

NM:
Estou a ler "Terra Sonâmbula", de Mia Couto, e "Fahrenheit 451", de Ray Bradbury.


HOTM:
Há algum autor ou estilo literário que queiras destacar?

NM:
Mia Couto é neste momento o meu escritor favorito. A forma como escreve, a mistura de contos africanos com a vida actual é bastante apaixonante. Acho que vou ler tudo dele.

 


HOTM:
Além de consumidor de cultura, já estás a preparar a próxima geração, tendo uma filha a estudar artes. Foste tu a influência?

NM:
Nada disso. Foi a minha mulher. Sé percebo de arte na óptica do consumidor. Se me pedires para desenhar desenho uma pessoa ao estilo do boneco do enforcado.


HOTM:
Por falar em enforcados, a arte é um parente pobre da sociedade, é não só na nossa: vês com preocupação um futuro profissional difícil nesta área para ela? Ou tens sucessão nos seguros?

NM:
Não vou ter nenhuma sucessão. Ela vai conseguir singrar no que faz. É muito focada e dotada. Pode custar no início mas tenho a certeza de que irá viver só disso.


HOTM:
És utilizador da IA na tua vida? Achas que a vida vai mudar muito com a inteligência artificial?

NM:
Sou cada vez mais utilizador. Olho com 90% de optismo e 10% de receio. A internet também foi uma preocupação e agora não vivemos sem ela. A IA e a tecnologia simplifica, e muito, a nossa vida. Vai tirar emprego? Vai. Mas vai tirar emprego a quem não souber aprender a viver e conviver com ela. Os novos analfabetos não são os que não sabem ler, são os que não sabem se adaptar. Eu já era completamente digital antes do COVID, muita gente foi empurrada nessa altura, alguns ainda não aceitam e estão a "morrer". Eu tenho mais clientes do que nunca, e cada vez menos trabalho, esse é o caminho. Perguntei ao meu enteado o que ele achava, e ele que trabalha em ciber-segurança disse: "Abraça e aproveita. Não podes lutar contra isso.". Tenho grande esperança principalmente na saúde. O salto vai ser brutal!


HOTM:
Muito obrigado pela entrevista. Se quiseres deixar algum comentário final, está à vontade; no meu blogue não há limites editoriais!

NM:
De nada. Espero que tenha sido algo de jeito! 😂




sábado, 27 de setembro de 2025

As crónicas crónicas - pt. I - uma viagem aos serviços públicos


Repartição de Finanças de S. Crucificação (lugar fictício, obviamente, baseado em factos reais, ou surreais para ser mais preciso). É um sítio que nem o demónio conseguiria inventar. Finanças tem de ser nome feminino. É do mais perverso que existe. Não é por acaso que A Morte também é fêmea... Um gajo como eu, Cidadão Bem Disposto, (CBD para os amigos, incluindo para quem isto lê), (narrador consciente, que fica inconsciente perante estes acontecimentos surreais, baseados em factos reais), que até tem noção de que não é propriamente burrinho, é levado a sentir-se o gajo mais ignorante do mundo nestes balcões... E ainda por cima a reboque de meias verdades e de imprecisões dos próprios serviços. Hoje calhou-me um clássico: "Não é aqui.". É preciso acrescentar mais? Claro que sim, embora todos saibamos parte da história que se vai seguir. "Por este andar nem vens de manhã!" - vaticina o meu colega de escritório, Colega De Escritório (CDE doravante), a quem humildemente avisei de que poderei demorar, dado ter assuntos a tratar nas repartições públicas deste país, Calquincida (sim, não existe, o nome de tal país, mas existirão os seus jeitos). "Tenho de ir, tenho uma reunião aí às 11h30.", respondi, acreditando mais em sonhos do que em realidades como esta...

"Tem de ser tudo direitinho", dizem-me, os outrora funcionários, agora chamados colaboradores, deste serviço - ironicamente, não me parece haver grande vontade de colaborar da parte deles. E está tudo direitinho, constatam, analisando tudo o que mostrei estar feito neste caso que apresentei à sua apreciação, e que teima em não avançar, apesar de, na minha perspectiva, estar feito tudo o quanto é possível da minha parte de cidadão de bem, ou não fosse esse o meu nome. "Soluções?", questiono. "Voltar a fazer o mesmo.", retorquem.". Como sei que não acontecerá o mesmo?", indago. "É esse o procedimento.", persistem. "Não me podem ajudar mais!?" - aspiro. "Não. Não é aqui." - contra-atacam. "Onde é?" - atiro. "No IRN." - , aburguesam-se."." Bom dia, obrigado." - agradeço. 

Sim, ainda agradeço, por nada mas agradeço. Aceito. Só me resta, obviamente, perseguir a solução, e dirigir-me ao IRN. Instituto de Registos e Notariado. Notável. Registos. O registo. Masculino. É mau na mesma, mas algo melhor. Esperemos que tenha sorte...

"Parece que ainda vivemos no século XVIII na função pública!" - diz o meu CDE. "Talvez possa começar uma série de época." - coagito, agitando-me, pois sempre tinha a reunião marcada para o fim da manhã, que pela amostra se afigurava longa. Continuo a ser um CBD, com boa disposição, a levar tudo na positiva, na desportiva, talvez hoje se batam recordes, quanto tempo demorará isto a ser resolvido?! 

Mudo de ares, das Finanças para os Registos. Num mundo ideal haveria um balcão onde se resolveria tudo, assim como, sei lá, uma loja do cidadão (?!), mas não aqui na Calquincida. Menos ideal mais ainda bom seria concentrar os serviços públicos num mesmo edifício, mas não aqui na Calquincida, um país utópico, ou melhor distópico, que até parece real. Assim, só me restou voltar a entrar no carro, ouvir um pouco mais o programa de rádio, e desaguar noutro mar de gente. 

Estou a observar... Não vim aqui ter por acaso... Há picos de trabalho, claro, mas há quem não faça mesmo um caralho - penso, enquanto CBD, claro, atento e interessado na evolução desta nossa sociedade. Quero com isto dizer que não costumo recorrer ao vernáculo se não nos meus pensamentos, ou iria ter de correr estes colaboradores a palavras mais directas e menos simpáticas, nem sempre bem aceites, como um "Vai-te foder!". Observo a lentidão de processos. E por mim estaria tudo bem, se não fosse o meu dinheiro aqui envolvido. Que é. Na qualidade de contribuinte. Somos nós, contribuintes, que pagamos esta ineficiência. Ironicamente, quem menos contribui para este estado de coisas é quem mais contribui, pois sabemos contribuir para algo que está longe de aprovarmos, que nos enerva, e que não muda apesar desta nossa consciência. Deste modo, para sobreviver no meio desta merda temos de ser mais eficientes do que os ineficientes que nos sugam os recursos. A administração. A pública. Mais femininos. Mais desgraça. As contas. As públicas. É impossível ser bom no meio disto. 

"O que estás aqui a escrever merecia uma publicação: o teu blogue ainda está activo?" - bem se lembra o CDE. Está pois, activo, o blogue, e para esclarecer, os serviços são tão céleres que consigo escrever a história enquanto a vivo, ou seja, enquanto aguardo a evolução (?!) dos serviços nesta matéria. Em qual matéria? Não interessa, é um exemplo, um bom exemplo, como por exemplo nenhuma criança responde que quer ser funcionário público quando for grande, porque as crianças são inteligentes, e querem ser heróis, não estes anti-heróis de crachá, devidamente identificados, inutilmente, parte de uma massa acéfala que se vai movendo, do seu próprio jeito, sem grande pressa, igualmente conhecida como função pública. Sim, este enorme organismo é composto de vários membros, membros que interagem entre si, que fazem parte dum status próprio, que só eles conseguem viver. Falam entre si. Riem-se. Como se fosse possível, para quem está de fora, achar alguma graça a ter de recorrer a estes serviços.  

Gostaria, contudo, de me juntar a algumas conversas. Entender o outro lado. Ganhar dinheiro sem fazer um caralho, e ainda me achar o melhor do mundo - oh sim, este CBD inveja esta escumalha pública. Entretanto reparo numa maior agitação entre esta mole de colaboradores. Um balcão em particular. Uma conversa entre dois exemplares dessa raça que nos atende (?!). Alto, alguém se levanta! Vão tomar café! Só pode! Ah, já percebi. Um filho duma puta dum gajo qualquer tirou a senha que uma delas tem de atender. Já disse que eram duas gajas? Não é preciso, eu sei. Quem me lê percebe. Que cabrão, deixou de produzir para vir fazer o cartão de cidadão! E interromper a conversa. Filhos duma puta! "Amiga, atende esse que vou tomar um café, que a manhã já vai longa..." - diz uma para a outra. E eu à espera, com uma reunião marcada que se aproxima, perto do sem saber o que fazer: arriscar sair e ter de vir viver este Inferno num outro dia? Ou passar por mau profissional e desmarcar a reunião, esperando que esta manhã seja suficiente para o meu caso? Uma coisa de cada vez ainda tenho alguns minutos. 

Enquanto uns nada fazem - ei-los à descarada, nem tentam disfarçar - , outros só atendem uma senha. Específica. Uma letra. Cuspida pela máquina das senhas, enquanto as ainda há. Por isso se vem de manhã, de tarde só digere, não cospe, não nos atendem. Assim está organizado. É racional? Não, é a administração pública...

Incrível, a primeira que abandonou para ir tomar café chegou apenas uns cinco segundos antes do trabalhador se retirar. Já devem ter isto cronometrado. Assim fico a saber que, para lá da porta onde a espaços desaparecem alguns destes exemplares funcionários da nação, haverá uma máquina de café. Se calhar também o pago. Uma parte em milhões, claro, mas também o pago. O pagamos: só o irmão contribuinte consegue chegar tão longe na leitura desta narrativa, porque se sente compreendido. Obvamente, o café deve ser pago pelo estado. Por que sequer o questiono?! É o mínimo que este país pode fazer pela produtividade dos seus melhores... Também me apetecia: não o merecia? Afinal também o pago... 

O Sr. B, um qualquer colaborador público, por acaso com bigode, que não se importa de se anunciar, tal a discrição do seu trabalho, é a cara deste grupo, e do melhor que há neste serviço: acaba de desligar-se da sua função e dizer que "já vai", e vai mesmo, com um saco de papel na mão, que sendo opaco não esconde o cheiro a doce, lamento ser perspicaz, e vai para onde?! Sim, a porta sagrada! Vai lanchar, como é óbvio. Até porque os serviços abrem às 09h00, e isto como é muito rigoroso tem de estar à frente do café às 10h30! Falta um minuto... Já chegarão os dias em que está de mau humor por alguém tirar a senha nas imediações da hora do lanche do Sr. B. Não há respeito! Sim, tem idade para a reforma, ou quase (mas não temos essa sorte), tem óculos, cabelo curtinho, bigode (claro!), e mete-se com as meninas que vão passando, subtilmente, dando os bons dias, e descaindo piadas de circunstância. Sublime. Se este gajo não vota no PSD (Partido da Sociedade e da Democracia da Calquincida) não percebo nada disto. Disto de quê? De observar pessoas. Talvez não perceba mesmo, mas o Sr. B obviamente vota PSD. São eles que lhe dão o pão (partido actualmente no poder na nobre Calquincida). 

Arrisco croissant, pão não era, pão não cheira a doce. Pão é para o povo. Cheira a algo simples. A algo que o povo nem sempre come. Aqui o povo não é digno de mais, é uma sorte se houver senha para esse mesmo dia. Não se pode querer tudo. Temos de estar gratos pelo que temos. Graças a Deus!

Por falar em Deus, não sei por que me queixo, só estou cá há quarenta e cinco minutos... E estou ao lado do sítio onde vou ser atendido. Onde a amena cavaqueira persiste, sim, entre outras duas gajas, mas uma de cada lado do acrílico, não haja confusões. É outra coisa... mas vai dar ao mesmo. À mesma ineficiência. Fico, contudo, esperançado que, comigo, haja a mesma familiaridade no trato. A mesma amizade no falar. A mesma doçura no convívio. Mas duvido, porque eu sou um pouco mais enérgico, digo a verdade e sou mais rápido e eficiente, sou um prevaricador! E isso nota-se! Deve haver um código secreto de conduta, que sugere baixar a energia de gente assim. Os serviços estão bem como estão... Cinquenta e um minutos depois de entrar, o meu destino vaga de cliente. Como será comigo?!

"CDE, entretanto chegarei com algum perspectiva de solução, espero, e a tempo da reunião. Até já." - anunciei. "Troca os locais e nomes e pública, para partilhar, isto é muito bom para ficar só aqui!" - sugeriu, e bem, o meu CDE. E passados uns meses concretizou-se. E chamar-se-ão "crónicas crónicas". Estas e outras como esta. 

O assunto que me levou aos serviços, esse ainda não está resolvido. Talvez nunca esteja. Qual é? Não interessa. Assim como não estamos nós resolvidos, os cidadãos dados à reflexão - que também não interessam a esta nação -, mas estamos atentos, e com uma palavra a dizer. 


Olho para o exterior e vejo a chover. 


Hoje vim ver uma peça de teatro

Hoje vim ver uma peça de teatro
e é claro que esta cultura é nobre
como também é um parente pobre
devotado a sobreviver de quatro.

À medida que se desenvolve o acto
e que a verdade nua se descobre,
inútil qualquer bilhete que se cobre
se na sociedade há arte sem impacto. 

A carne é pouca p'ró espírito forte,
mal remunerado, ainda que aplaudido,
deixando a pessoa actor à sua sorte

Mas e mudar se sempre assim tem sido?
Vamos todos a caminho da mesma morte
Mas vida nem todos terão vivido.

26/09/2025



quinta-feira, 25 de setembro de 2025

Caos em nós

Caos em ti, caos em mim,
será este o começo do fim?
Mais um drone foi lançado, 
outro espaço aéreo fechado;
lestos somos sempre na crítica
mas qual o efeito na política?

Votos contados, de quem foi à urna,
qualquer a contagem, hora soturna...
Como se evolui? Se nada muda,
se sou só mais um quem me ajuda?
Quem eu ajudo? Quem me coordena?
Quem eu coordeno? Quem mais ordena?

Será que ainda contam com o povo?
Já tinham pensado nisto ou é algo novo?
Serei o único, ou alguém me escuta?
Todos governados por filhos da puta,
todos enganados por promessas falsas,
pedras nos sapatos que nunca descalças...

Zangado!
Revoltado!
Alienado!
Se não gostas de mim, aceito,
mas entende o meu conceito
de justiça social, não sensacional,
ou o que é ser simplesmente racional.
Quem tem voz
neste caos em nós?

Guerras de palavras, guerras com sangue,
fico mudo, receoso, atónito, exangue, 
rastos químicos, um bom ambiente,
mesmo que neguem está mais quente,
famílias monoparentais, vazias, a ocidente,
famílias a mais, a sobreviver, a oriente: gente...

Medicamentos, drogas recreativas,
mamas de plástico, drag queens e divas,
valores e morais, caídos em desuso,
descompensado porque não os recuso,
sugar daddy, mommy, ou seja lenocínio,
nada é mais perigoso do que ter raciocínio.

Geneticamente modificado, visando o lucro,
ciência e tecnologia de paradigmas, sem fulcro,
ouve o que eu digo, não o que eu faço, 
a hipocrisia é religião, sem embaraço,
a salvação virá, de modo eventual,
talvez haja alguma paz espiritual...

Zangado!
Revoltado!
Alienado!
Se não gostas de mim, aceito,
mas entende o meu conceito
de justiça social, não sensacional,
ou o que é ser simplesmente racional.
Qual a tua voz
neste caos em nós?

25/09/2025




https://pt.wikipedia.org/wiki/Caos_%28mitologia%29#/media/Ficheiro:Lotto_Capoferri_Magnum_Chaos.jpg


De novo deitado ao lugar escuro

De novo deitado ao lugar escuro,
poiso comum onde calado grito,
imóvel, mas em turbilhões reflito,
o quanto p'ra mim o destino é duro.

Não há lugar em que sinta seguro
o meu ser, nem neste bréu, neste rito,
onde a cada conclusão me hesito,
e a cada mão dada ergo um muro.

"Vai ficar tudo bem." - não acredito!
Não há essa paz que tanto procuro,
nada fica do que já tenhas dito.

"Acredita no teu coração puro,
não vês o quão consegues ser bonito?"
- não, calem-se, já não me/vos aturo!

25-09-2025

sábado, 13 de setembro de 2025

Não saias da tua sombra com pressa

Não saias da tua sombra com pressa
de ir para aquele raio de branca luz
que tanto a permite como seduz
a ignorar o que tanto te interessa.

Dou a minha ajuda sem que alguém peça
pois já estive ensombrado na cruz, 
sem comunicação, o que reduz
as chances de acabar, se não começa...

Porque não começar por abraçar
a escuridão que agora te rodeia?
Sim, dói, custa, mas tudo vai passar.

Sei bem a dor que está a ameaçar
a tua existência, nunca tão cheia
da cor que seguirá a te acalmar.

13/09/2025



sexta-feira, 5 de setembro de 2025

Bem-vindo

Operante,
cooperante,
embora distante
despeço-me: 
adeus.

Enfim, 
não é para mim
isto assim,
talvez um nim
mas dos teus.

Espera,
desespera,
alma sincera;
degenera
quem sai aos seus.

Voa,
na boa,
à toa,
mesmo que doa
és dos meus.

Bem-vindo ao reino dos céus,
ou ao dos infernos?
Quem sabe?
...

05/09/2025

quinta-feira, 4 de setembro de 2025

Queres que eu tente?

Um rol de medos injustificados,
que se justificam na minha mente,
de novo perguntas se estou contente?,
não me vês no baile de alienados?

Certo, concedo, pois estamos parados,
vaiados no meio de toda a gente,
aparentemente é-nos indiferente,
tão corajosos como amedrontados.

Saberás que o manto, que mal assente, 
é rasgado de lado, atrás, à frente,
é só algo que já não nos conforta?

Um paramento novo? Queres que tente?
Presente, inconstante, vetusto, ausente,
é um poço, uma janela, uma porta?


04/09/2025

segunda-feira, 30 de setembro de 2024

Regresso

Sabes o que te peço?

Esquece...

É o teu regresso

ao teu velho Mundo?

Ao teu novo Mundo?

É algo, é verdade,

é mentira, é saudade,

é o que for, 

o que tiver de ser, 

mas é, e quer-me parecer

que... talvez... seja...

a dor que não mais aleija,

a voz que não mais dói,

sou a fama da inveja,

dor que não mata mas mói

e assim se constrói...

Edifica.

Já que voltaste...

Fica!


30/09/2024




sexta-feira, 24 de julho de 2020

Dão-se como cão e gato.


Quem não conhece esta expressão? É uma expressão de conflito: é porque se dão mal. Então quererá dizer que cães e gatos têm uma convivência difícil! Será assim? Uns dizem que sim, outros dizem que não… E, neste momento, entre os que lerão isto, não faltam defensores de ambos os lados: “Tenho cães e gatos há anos e dão-se todos muito bem!” / “Não os posso ter juntos pois ficava sem casa, e sem animais!”. E há uma terceira facção – a minha – que corresponde às pessoas que nem tem cão nem tem gato, e cuja discussão deste tema é mais ou menos indiferente: somos os eremitas desta sociedade. Até me sentiria mal em estar fora de moda mas como é o costume uma pessoa habitua-se… Agora até tenho um filho mas como não tenho cão devia estar calado. Nem gato. Mas aqui há gato: devia ter um amigo de quatro patas em vez dum bebé humano? É que ambos gatinham, por exemplo. E se tento dar opinião? “Mas tens cão? Tens gato? Cala-te!”. Tenho ácaros aqui em casa, e bastantes – conta? Claro que a raça dos insensíveis que não têm animais de estimação, a que pertenço, curiosamente pertencem também à raça dos que nunca abandonam animais de estimação. Mas disso ninguém fala… São pontos de vista… “Esses não são os verdadeiros amantes de animais!” – dir-me-ão, e tendo a concordar. Mas e aqueles que fecham um animal no seu apartamento? E aqueles cães que poderiam ter tido um futuro na conquista espacial canina e fazem estragos entre a cozinha e o quarto? E aqueles gatos que davam para as finanças mas simplesmente arranham sofás? E as iguanas? E os peixinhos de aquário? E os passarinhos? Falem deles! Têm tanto direito ao conflito como cães e gatos. Defendam-se, com unhas e dentes. Estamos em guerra!

quarta-feira, 8 de julho de 2020

Ennio Morricone - Two Mules For Sister Sara


Até ver, toda a gente morre, o que é igualmente válido para aqueles que apelidamos de génios. E serão génios aqueles que fazem mais ou melhor do que a maioria (os que também morrem mas no anonimato…). Sendo, provavelmente, tão cinéfilo como melómano, não poderia ficar indiferente à partida de Ennio Morricone – e não fiquei; fiz aquilo que a maioria dos seus admiradores terá feito: ouvir a sua obra, ou parte dela, pois é bastante extensa.

Poucas horas após a notícia da partida deste memorável fazedor de sons de filmes memoráveis, ouvi na rádio uma breve entrevista à Dulce Pontes (uma Portuguesa que canta bem), que teve de aprender a falar Italiano para ter o prazer de trabalhar com a lenda. Um exagero duma estrela inacessível? Ou um filtro necessário para aqueles que realmente tinham vontade e o espírito de sacrifício necessário para conviverem com esta figura ímpar? Talvez aos génios tudo se deva perdoar, e para se chegar ao seu convívio tudo se deva fazer. Como sempre, sobra algo: uma vasta obra que felizmente todos podemos e devemos apreciar.

O bom (o magnífico) de ouvir Ennio Morricone é que a qualidade musical coincide com a cinematográfica. Das fantásticas composições que constituem a sua obra, aquelas de que toda gente fala por estes dias, associadas a filmes tão famosos quanto as suas bandas sonoras (The Good, the Bad and the Ugly; Cinema Paradiso; A Fistful of Dollars; Once Upon a Time in the West; Once Upon a Time in America; The Mission; por exemplo, e que adoro tanto musicalmente como “sétima-artemente”, a que juntaria alguns dos “seguintes”, e que igualmente idolatro como 1900; Il Fiore delle Mille e Una Notte; The Untouchables), não terei muito a acrescentar. Portanto, e a lista dos restantes continua a ser extensa e riquíssima, vou destacar apenas um filme – e respectiva banda sonora assinada pelo mestre – de que gostei particularmente, um western menos conhecido mas que diria merecer mais fama: Two Mules For Sister Sara, cuja banda sonora integral se pode encontrar no youtube (https://www.youtube.com/watch?v=1vnQDmBUpm4).



Da parte sonora desta obra destacaria, obviamente, o tema principal, de que gosto particularmente pois, além da grande inspiração de sempre, revela uma grande inteligência (por exemplo, consegue-se ouvir uma mula a zurrar “musicalmente”), e assenta perfeitamente na história do filme, pois remete-nos para uma longa viagem cheia de peripécias, que efectivamente acontece, e é o interesse central do filme. Aliás, uma das grandes homenagens que repetidamente se fazem ao maestro é exactamente a fusão do som e imagem em “obra de arte de excelência”, chamemos-lhe assim. Infelizmente, a tradução do título para Português (“Os  Abutres Têm Fome”, como a tradução do título para Italiano), ainda que não totalmente descabida, perde todo o jogo de palavras do título original: mula como mula de carga ou como alguém que faz transporte duma mercadoria ilegal, referência às duas mulas que acompanham a Irmã Sara (Shirley MacLaine), talvez não tão religiosa quanto era suposto: a “besta de carga” e o Clint Eastwood (imediatamente antes dos seus maiores sucessos no cinema como actor). Pode-se ainda referir que as mulas são estéreis; assim como as freiras, certo!? Enfim, um título sugestivo e bem conseguido. A dupla de actores tem uma química apreciável, o humor está bastante presente, e tudo junto creio ser dos melhores filmes que vi, pelo menos naquela categoria dos “bons filmes que não têm a fama que merecem”. Ouçam, vejam, apreciem!



sábado, 31 de março de 2018

L7 came back to bitch!

Quem me conhece, sabe a importância que as L7, e outras bandas da mesma época, tiveram para mim. O regresso da banda aos palcos (2015) foi uma grande notícia, que me encontrou numa fase menos interessante da minha própria vida, mas o melhor ainda estava para vir: a nova música, que me soa às L7 que queria voltar a ouvir! E assim, com esta crítica, comentário, opinião ou o que lhe quiserem chamar, também regresso ao meu blogue!

Indo imediatamente ao cerne da questão, quem gostar de L7, quem gostar de grunge, punk, metal, música dos anos 90 ou o rótulo que vos agradar, pode e deve ouvir a nova música destas resistentes do movimento grunge (seja isso o que for): I came back to bitch (cliquem no nome da música que chegam ao youtube).


Esta música é poderosa! Obviamente que é parecida ao maior hit (?!) das L7, a Pretend We're Dead, até porque grande parte das notas são iguais, especialmente aquele riff inicial. Tendo semelhanças, contudo, coloca-a lado a lado com outras das grandes músicas da banda. O poder eléctrico está lá, a irreverência (não da juventude mas da experiência) está lá, as letras carregadas de ironia e atitude também: felizmente que ainda há quem regresse para agitar as águas porque o ar está mais estagnado que no início dos anos 90... A voz está desafinada, claro que sim, e não é que soa a algo real? A produção poderia ser melhor, claro que sim, mas não estamos todos um pouco cansado do excesso de maquilhagem dos nossos tempos!? Bem, eu definitivamente estou. Não é aborrecido observar os tempos plásticos e hipócritas que vivemos?! Felizmente que este pedaço de arte me vai dar algum oxigénio para sobreviver a esta nossa atmosfera rarefeita do início do terceiro milénio... O vídeo, que está ao alto nível da música e da história das L7, e que poderia ter sido feito há mais de 20 anos, tecnicamente falando, é o que qualquer amante da banda esperava! Perfeito! E felizmente poucos vão concordar comigo, mas também regressei para protestar!

Antes desta nova pérola, as L7 lançaram uma outra música, Dispatch from Mar-a-Lago, que não me entusiasmou tanto, musicalmente falando, embora a atitude esteja lá: Mar-a-Lago é um resort pertencente ao Presidente Donald Trump... Em 1992, no álbum "Bricks Are Heavy", produzido pelo guru Butch Vig (sim, o mesmo que produziu o Nevermind, dos Nirvana, entre outros míticos álbuns da época), facilmente considerado o melhor álbum da banda, podemos retirar estes versos deliciosos da primeira música, uma tal chamada "Wargasm": "body bags and dropping bombs / the pentagon knows how to turn us on / wargasm". E agora, 26 anos depois, não farão ainda mais sentido estas palavras, nomeadamente com as atitudes à Trump com que somos bombardeados quase diariamente?

Para acabar, e agradecendo imenso às L7, pois são parte do já bastante diminuto legado vivo do chamado grunge (onde a última grande perda se deu o ano passado com a morte do Chris Cornell), ouçam esta música, ouçam rock (que recentemente foi oficialmente ultrapassado pelo r'n'b em número de músicas, fenómeno este que daria um livro mas que não vou abordar agora), protestem o que têm a protestar, mexam-se e sejam vocês mesmos! Caminhamos, a meu ver, para tempos cada vez mais padronizados e perigosos, onde ser diferente começa a ser censurado, e todos sabemos onde isto pode chegar... Se tivermos de recrutar artistas de meia idade para recordar à juventude que deve ser irreverente, que assim seja!

quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Brevemente...

Entrevista à Confienergy em breve...


sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

ENTREVISTA - Susana Ferreira, Xadrezista e Engenheira Civil

Susana Ferreira, é para mim um grande prazer poder contar com esta entrevista no meu blogue. Já nos conhecemos há bastantes anos mas começamos a falar mais regularmente após o Campeonato Nacional de Jovens de Xadrez, em 2003, em Aveiro. Já vivi na tua cidade, Aveiro, já entrevistei o Daniel Santinhos, que também vive lá, mas vens regularmente ao Porto; desta vez, vai o Porto ter contigo nesta entrevista. Estou a escrever um artigo sobre a falta de mulheres no xadrez e este será um dos tópicos que vamos abordar... mas não só!


HIGH ON THE MOUNTAIN:
Vamos começar com uma questão fácil. Como começaste a jogar Xadrez?

Susana Ferreira: Olá Morais! É para mim um privilégio escrever para/no teu blogue, que acompanho há tanto tempo!
Conhecemo-nos neste meio do Xadrez, por isso parece bem começar por explicar como me iniciei nesta modalidade; acaba por ser caricato! Costumava passar férias com os meus pais e com os meus irmãos. Num Verão, a casa onde estávamos não tinha televisão (a minha irmã deveria ter uns 9 anos, eu 6 e o meu irmão 5). Para nos entreter, o meu pai comprou um jogo de xadrez! E não é que passámos as férias a jogar?! Hoje em dia, dizem que as crianças não devem estar tão ligadas às “novas tecnologias” mas na altura foi como um “recurso” à televisão… Que passou a ser parte da nossa vida! Quando começou o ano lectivo, o meu irmão entrou no clube de xadrez “O Primeiro Passo”, e mais tarde eu e a minha irmã também nos juntámos ao clube. Desde então, o Xadrez não nos deixou mais em paz! :)

Campeonato Nacional Universitário, Vila Real, 2013.


HOTM:
O que mais te atrai neste jogo/arte?

SF: Pergunta difícil… Uma das principais coisas de que gosto, é de me sentar e concentrar-me no jogo, é como se entrasse noutra realidade... Encontrar soluções para o que vejo! Claro que não consigo deixar de parte a beleza que esta obra de arte envolve: ver planos, estratégias de uma boa partida de Xadrez, é maravilhoso! E o bichinho do Xadrez? Esse, que faz com que o coração bata mais forte por esta modalidade?!... Também é inspirador! Ainda por cima, o xadrez, está em todo o lado; é um padrão, é uma prisão, é um mote publicitário que dá que falar, aparece em imensos filmes/séries (desde Harry Potter a 007; passando pelo Dr. House). “Quem vence um jogo de xadrez? Quem comete o penúltimo erro”.


HOTM:
Quais os teus objectivos pessoais como Xadrezista?

SF: Já tive os objectivos xadrezísticos mais presentes na minha vida, agora já me sinto velha ehehe. Posso apenas dizer que gostava de perceber mais deste maravilhoso Jogo?! Acredito que assim, mais cedo ou mais tarde, os resultados/subidas de elo/participações internacionais simplesmente aparecem... Mas não nego que deixar de ver o dígito (1) da casa dos milhares, era sempre bom!


HOTM:
Por que há tão poucas mulheres a jogar Xadrez? E como se pode "chamar" as mulheres para o nosso desporto?

SF: Debato-me com essa questão há muito tempo... Pessoalmente e de forma sumária, vejo aqui 3 factores a considerar: as mulheres, os Xadrezistas do meio e a sociedade! Creio que mulheres que se interessam jogam; independentemente de haver prémios/campeonatos em separado (o que sinceramente ainda é algo que não consigo perceber bem...), “quem gosta, gosta sempre”. Se há menos mulheres, o nível xadrezístico (analisando unicamente o rating “ELO”) é menor; o que parece também ser natural... Mas o interesse em jogar xadrez tem que partir da mulher... Ninguém quer obrigar ninguém a nada, certo?! Questões do foro “psíquico”, não me cabe a mim opinar, mas deixo-vos 2 links com discussões sobre isso, com 2 dos maiores xadrezistas de sempre: Nigel Short (http://www.telegraph.co.uk/culture/chess/11548840/Nigel-Short-Girls-just-dont-have-the-brains-to-play-chess.html) e Judit Polgar (http://time.com/3828676/chess-judit-polgar-nigel-short-sexism/) [cliquem nos endereços que vão lá ter]. Depois, os Xadrezistas são maioritariamente homens. E como sou mulher, percebo que por vezes algumas situações possam não ser as mais confortáveis do mundo, por haver outro tipo de tratamento por parte dos homens... Isto não ajuda a que as jogadoras se sintam bem durante os treinos/torneios. Acho engraçado - e não me choca, (in)felizmente - como se vê na internet imagens de mulheres (com pouca roupa) e tabuleiros de Xadrez; partilha de fotos nas redes sociais de mulheres bonitas que jogam xadrez; listas com rácio beleza/ELO... e de homens, é mesmo difícil encontrar algo semelhante sequer! Sim sim, já fiz essa pesquisa, para contrapôr isto, mas não encontrei nada de relevante... Por fim, acho que a sociedade ainda não está como a queremos. Embora ache que isto está a ser ultrapassado ao longo dos anos, penso que ainda não é visto de igual forma que uma mulher jogue xadrez, comparativamente ao homem: que estude xadrez; que vá jogar torneios, sozinha; que dispense tempo para este desporto... Esta visão “quadrada” atrasa o desenvolvimento e a abertura que existe para a evolução na modalidade, sendo mais flagrante numa idade mais jovem. Para trazer mais mulheres, não encontro uma fórmula mágica: talvez, quando não se pensar nestas coisas/quando se agir em conformidade perante todos, “isto” avance e comecem a jogar mais mulheres. Falar em publicitar o xadrez, como resposta genérica, não se aplica só à mulher, mas sim a toda a gente...

Sobre este tema, o meu artigo no blogue do Opening Master:


HOTM:
Recentemente foi criado um dress code para Xadrezistas! Que comentário te merece este facto?

SF: Quando li, senti-me revoltada... E deixo aqui o link oficial do que estamos a falar: www.fide.com/images/stories/NEWS_2013/FIDE/Proposal_of_Ms._B._Marinello_in_respect_of_the_dress_code.pdf. Talvez tenhamos sorte e não obriguem os Xadrezistas a usar uniforme! Acredito que tenha sido uma medida mais direccionada para as mulheres... e se isto ajuda a que mais mulheres joguem xadrez? Seguramente não! Confesso que tenho sempre algum cuidado para não ir demasiado informal quando vou jogar xadrez, mas é uma questão de respeito que tenho perante a modalidade! :) Ver, no “dress code” dos Xadrezistas, problemas (e acredito que já os tenha havido) é exacerbar as questões de género; o sexismo; etc. etc. ...


HOTM:
Já te sentiste, ou sentes-te, discriminada por seres mulher e Xadrezista? Ou, por outras palavras, o Xadrez é sexista?

SF: Há campeonatos internacionais separados absolutos e femininos. Prémios nos torneios para a melhor feminina! Isto não fala por si só? Atenção que neste caso é discriminação “positiva”, que também não acho propriamente justo... Acredito que não é por aí que jogam mais/menos mulheres. Como referi acima, creio que a igualdade é o caminho. Fica aqui um link com uma pequena história de uma jogadora de xadrez e os seus problemas: http://fanoudraws.tumblr.com/post/68091072768/sorry-this-post-is-so-long-open-images-in-new.


HOTM:
Houve, há uns meses, o primeiro campeonato de Xadrez das universidades europeias. Já foste Xadrezista e universitária. Por que tantos xadrezistas deixam de jogar Xadrez ao chegar à universidade?

SF: Eu tentei sempre ir conciliando as duas coisas, mas muitas vezes não é fácil... É outra fase das nossas vidas. Deixamos de ser jovens, a motivação de ser um “sub” desaparece, tornamo-nos séniores e “pior”: adultos com outras responsabilidades (e outros interesses)... Mas habitualmente a universidade dá trabalho; para além de dar trabalho, é cansativa. Os torneios de xadrez, nomeadamente lentas, ocupam dois fins-de-semana seguidos... ou mesmo que ocupem só um; é um fim-de-semana “só para aquilo”! Muitas vezes trabalhos ou estudo/outras actividades dificultam que se prioritize o Xadrez, que é tão absorvente! Desta forma, creio que é compreensível que se abrande o ritmo durante esses anos... Contudo, nas férias pode-se jogar sem preocupações. Acrescento: trabalhando fica ainda mais difícil... Ainda me ando a habituar à mudança de vida de estudante para trabalhadora! Porque, apesar de tudo, existe outra flexibilidade enquanto estudante, em termos de horários e “semi-obrigações”. Eu senti que tinha ligeiramente mais controlo sobre o meu dia-a-dia, coisa que como trabalhadora geralmente é difícil... Em contrapartida, as férias podem ser quando quiser e podem ser marcadas consoante torneios (que dantes calhavam seeempre em épocas de exames da universidade!).

Campeonato Mundial Universitário de Xadrez, Guimarães, 2012.


HOTM:
E será que este novo torneio poderá ajudar a combater esse problema?

SF: Oh, não acredito. Sou a favor da existência de mais provas, claro, mas não é um único torneio que vai mudar isso... E, geralmente, “são quase sempre os mesmos” nesse tipo de torneios. Talvez divulgue a modalidade na universidade onde se realiza e traga mais jogadores! Também existem os torneios da FADU [Federação Académica do Desporto Universitário] e não é por isso que a situação se altera... Para colmatar este problema... Hmmm... o ideal seria regimes mais flexíveis para quem quer jogar! :)


HOTM:
Por falar em problemas, actualmente representas o GDDF (Grupo Desportivo Dias Ferreira). Não há clubes de Xadrez em Aveiro? Ou quiseste representar um clube melhor?

SF: Existem clubes de Xadrez, ligeiramente mais direcionados para jovens, mas também há adultos! Gostava de jogar por equipas e isso fez-me procurar um clube maior, em que fosse mais fácil fazê-lo. Conheço o Vitorino (diretor do Grupo Desportivo Dias Ferreira) quase desde que me lembro de entrar para o xadrez, então senti que só seria benéfico para mim, mudar de clube. Pelos meus resultados por equipa, talvez o clube não ache o mesmo ehehe.


HOTM:
O GDDF ganhou o Campeonato Nacional de Xadrez em 2013/2014 e ganhou as duas últimas edições da Taça de Portugal (2013/2014 e 2014/2015)? Eu, que sou formado no clube, senti com grande emoção estas conquistas. Vinda de "fora", e sabendo que pelo menos o Campeonato Nacional era algo inesperado, qual foi a sensação destas vitórias?

SF: Fiquei contente, claro. Mas honestamente sinto mais contentamento pelos resultados do grande jogador Jorge Ferreira [perfil na FIDE], nesses campeonatos! Actualmente, os campeonatos, apesar de se denominarem “nacionais”, por vezes pouco têm de nacional - especialmente num nível mais alto. Mas deixo este tema para futuras discussões!


HOTM:
Por falar em discussões... És sportinguista, o que confirma que ninguém é perfeito. O GDDF venceu a última Taça de Portugal ao Sporting, precisamente. Por quem torceste na final?

SF: Aahahah não é o facto de ser sportinguista que me leva no caminho da imperfeição! :) Na verdade, sou Beira-Marense desde pequenina... É o clube da minha cidade! Mas o GDDF é o meu clube de Xadrez, não poderia estar a torcer por outro; mesmo desejando todas as vitórias possíveis ao Sporting!

A segunda Taça de Portugal consecutiva do GDDF.


HOTM:
Vitorino Ferreira 1 - Bruno Carvalho 0. Vitorino Ferreira, o Presidente do GDDF, cuja entrevista neste mesmo espaço está preparadíssima há longos meses e à espera de uma resposta, é por muitos apelidado o Pinto da Costa do Xadrez. O Sporting tem um bom presidente? É bom ser um personagem interventivo e atento ou alguma moderação ser-lhe-ia benéfica?

SF: Julgo que ser apelidado de “Pinto da Costa” nunca pode ser bom! Mas sim, percebo a analogia, pois pelo menos no Norte do país, não existe ninguém tão emblemático como o Vitorino. Bem, o Bruno de Carvalho é um verdadeiro Sportinguista. Começou por conseguir fazer novas eleições; renegociou dívidas; mexeu no clube! Agora, trouxe o Jorge Jesus (ainda estou reticente)... E apesar de estar quase a ser campeão de Inverno (que é pouco indicativo, remetendo ao passado), a verdade é que devolveu alguma esperança aos Sportinguistas, muito por ser interventivo! Até eu ando a pensar fazer-me sócia “num minuto” (passo a publicidade https://socionumminuto.pt/). Na minha humilde visão, ele exagera um bocado. Querer punir sócios por escreverem mal do Sporting nas redes sociais?! Responder sempre a insultos/picardias (e por vezes bastante ressabiado!), acho demasiado... Devia conseguir conter-se para não “dizer tudo o que lhe apetece”.


HOTM:
O Sporting andou desaparecido do Xadrez nacional durante anos. Pelo menos, dos grandes palcos. Já estivemos na Direcção da AXP (Associação de Xadrez do Porto) e sentimos algumas dificuldades em encontrar as pessoas certas para as necessidades da modalidade. És de Aveiro e jogas em Matosinhos. Tudo isto reflecte algumas dificuldades que o associativismo enfrenta actualmente?

SF: Será que o associativismo não esteve sempre em dificuldades?! Começo a acreditar que também existe o “bichinho” do associativismo, que nos leva a querer fazer outras actividades/novos projectos, mais e melhor, também a pensar nos outros. Apontaste um ponto importante: encontrar as pessoas certas! Somos todos diferentes, com características distintas; não faz sentido todos executarmos as mesmas funções no associativismo. Para mim, isso é das situações mais complicado de “lidar”... Confesso que sinto falta de ter o associativismo na minha vida. Tenho que criar um clube ou organizar um torneio ou algo assim; desde já estás/estão convidados! :)


HOTM:
Obrigado. Agora, vamos reflectir sobre estes últimos 4 anos que foram marcados pela emigração de jovens, alguns deles Xadrezistas, austeridade que também afectou o associativismo, cortes na investigação e desenvolvimento tecnológico... A austeridade parece-me jogar à defesa; o investimento parece-me ganhar iniciativa após sacrificar material. Falta estratégia na política? Faltam estrategas/Xadrezistas?

SF: A austeridade jogou “bem” ofensivamente nos últimos 4 anos... Eu acho que até houve estratégia, mas não foi centrada nas/para as pessoas. Vejo a política como um conjunto de estrategas, que aparentam ter todos diferentes objectivos e cada um a puxar para seu lado. Agora... Se faltam alguns estrategas como o Magnus Carsen (melhor jogador de Xadrez de todos os tempos http://magnuscarlsen.com/) que vejam um pouco mais além e que realmente ajudem a levar isto para a frente? Talvez!


HOTM:
O Xadrez faz falta como desporto escolar?

SF: Noutros países mais evoluídos, o Xadrez escolar é obrigatório. Deveríamos caminhar nesse sentido (e não o oposto, de acabar com ele como tem acontecido...). Acredito que o desporto escolar deve auxiliar esse processo de implementação e manutenção do Xadrez escolar! Recordo-me sempre de jogar o campeonato nacional de desporto escolar, onde estavam imensas crianças com idades próximas da minha! Íamos com colegas que frequentavam a mesma escola, jogar um dia inteiro noutra escola qualquer no país! Boas memórias de dias bem passados. Concluo dizendo que não tenho dúvidas de que o Xadrez é benéfico para a formação das crianças e para o desenvolvimento de capacidades relacionadas com o cérebro.

I Torneio Imperial de Aveiro, 2014.


HOTM:
Por falar em formação, és Engenheira Civil. Estás em Portugal. Exerces na área. Como está a Engenharia Civil em Portugal? É fácil arranjar emprego? Há perspectivas de carreira?

SF: Acho que já esteve pior, mas continua muito mau... Não é fácil ter uma primeira oportunidade; normalmente quem a consegue, prossegue e fica com algumas perspectivas de carreira. Mas não é um cenário nada ideal... Talvez as coisas dêem a volta, mas não tenho muita fé que isso seja para breve. A Engenharia Civil é muito abrangente e vejo que muitas vezes é esquecido pela sociedade (em particular pelas entidades empregadoras), que temos muitas valências que estão a ser subaproveitadas! E depois há outro factor: mesmo tendo essa polivalência é importante fazer-se o que se gosta. Eu estou feliz a nível laboral, mas vejo que é muito complicado encontrar oportunidades “ideais”.


HOTM:
Com certeza que muitos colegas teus já emigraram. Emigrar é uma necessidade ou uma opção?

SF: Acho mesmo triste tratar-se de uma necessidade; deveria ser sempre uma opção! Actualmente, se se deseja ter um nível de vida um bocado superior, sendo jovem, talvez seja uma necessidade obrigatória emigrar... Mas mesmo para arranjar estágio (e trabalho!), vejo que colegas de curso têm tido alguma dificuldade; mesmo com medidas “mediadoras” do IEFP... A que ponto as coisas chegaram!


HOTM:
Quando se fala em Engenharia, todos os créditos são dados à FEUP. A Universidade de Aveiro está em franca evolução, contudo. Do que conheces, talvez por discutires com colegas de ambas as faculdades, a FEUP é realmente melhor ou achas que ainda vive muito duma fama criada à volta da UP que se vai desvanecendo?

SF: Inicialmente, (e permite-me a correção?!) creio que os créditos eram todos dados ao Técnico, em Lisboa. Com o decorrer do tempo, o paradigma foi-se alterando, a FEUP foi ganhando notoriedade e mais recentemente, há mais faculdades/universidades marcadas no mapa a nível internacional. Relativamente à Universidade de Aveiro, quase diariamente saem notícias de novas descobertas tecnológicas e científicas; da FEUP não sei, mas sobre a UA continua a haver muitos motivos de orgulho! (Isto é apenas uma pequena picardia, pois assumo que defendas a tua UP).


HOTM:
Sobre a UP haveria muito a falar... Consideras abandonar o xadrez, eventualmente por motivos pessoais ou profissionais ou gostarias de jogar para sempre? Achas que é realista e compatível o equilíbrio xadrez/vida pessoal?

SF: Não sei o futuro, mas sinto que o xadrez já faz parte de mim. Considero que faz parte da minha vida pessoal! Mesmo se eu formar família, quero continuar a jogar. Acho que tudo é possível, basta equilibrar essa balança. Em todos os torneios que vou jogar, o que me costumo lembrar mais são as histórias que acontecem; o convívio, as pessoas; o local; as particularidades do torneio! É isso que levamos connosco, “after all”.

Em Barcelona.


HOTM:
Para acabar, que a entrevista vai longa, conta-nos uma história que recordes com particular emoção sobre a tua vida no xadrez. Essas histórias, como bem sabes, abundam no GDDF...

SF: Talvez possa apenas dizer que num dos primeiros torneios que fui jogar (que felizmente ainda se realiza!) em Cucujães, joguei com o Vitorino. Lembro-me que estava melhor, mas acabei por perder – que é tão comum... (Diz-se que os jogos mais difíceis de vencer, são os jogos onde estamos melhor!). Recordo-me sempre que o Vitorino disse-me que se notou que tive uma quebra de energia, que deveríamos sempre comer algum docinho a meio dos jogos. Não é uma história emocionante, mas foi uma lição para a vida!


HOTM:
Muito obrigado pela entrevista. Se quiseres deixar algum comentário final, está à vontade; no meu blogue não há limites editoriais!

SF: O Xadrez enriqueceu e enriquece a minha vida. Espero que todos tenham hipótese de sentir algo semelhante, por um “hobby”. Que façam amizades (e inimizades, também é preciso ehehe) com pessoas de todo o país e de todos os lados do mundo, que tenham histórias para contar! E, possivelmente, se não fosse o xadrez não nos tínhamos conhecido! :) Espero que te/vos dê tanto gosto a ler a entrevista como eu tive a escrevê-la!

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Cago e mijo e azio e vomito

Quando me dá vontade de cagar
também sou capaz de largar urina,
e tendo tempo faço-o devagar
pois gosto de meditar na latrina,
e fumar, abstrair-me e divagar,
bater uma a pensar numa menina,
limpar, tanto a mim como este lugar,
e reflectir no que a mente ensina...

Merda e mijo, tanto e tão belo,
castanho escuro/ácido amarelo,
o mundo tão podre caiu-me no goto
e só me livro dele... a cagalhoto!

Fico enfartado de tanta hipocrisia,
lágrimas de crocodilo, astúcia, manha,
o ácido sobe e não aguento a azia,
quero vomitar o que o corpo estranha,
meto dois dedos como o povo bem dizia,
na boca aberta que a taxa arreganha,
o vómito surge e o estômago esvazia,
fora de mim quem mal me acompanha!

Azia e vómito, tanto e tão belo,
cinzento, castanho, verde, amarelo,
o mundo tão podre caiu-me no goto
e até o regurgitar renovava o arroto!

Cago e mijo e azio e vomito
e dizem que não é bonito?
Querem que fique comigo
o excremento dito amigo?
Devo fortalecer amizade
com quem de me foder há-de?
A idiossincrasia é o que me resta,
livrar-me de tudo o que não presta!

Pessoas, pessoas e... pessoas,
tanto muitas más como poucas boas:
mentira, farsa, rancor e traição,
os alimentos da minha excreção...





segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Sobre os resultados das eleições legislativas de 2015...

Vou deixar aqui o meu comentário aos resultados das eleições de ontem. O que me apetece é mandar os portugueses à merda, a maioria dos portugueses, como é óbvio, que há sempre boa gente e má gente em todo o lado. Mas não vou mandar os portugueses à merda, vou dar os parabéns por acreditarem que estão no bom caminho. Eu não acredito... Também podia dizer que o povo é medíocre e estúpido, inculto e mal formado mas também me vou escusar de dizer isso porque, no fundo, a culpa disso nem é do povo, é dos políticos que se aproveitam dessa mesma ignorância que lhes é favorável... De igual modo, parecer-me-ia relevante salientar o carácter masoquista do povo, nomeadamente o culto sodómico, mas se o povo tem como um dos últimos prazeres baixar as calças, votar nos mesmos e persignar-se enquanto suporta a dor divina, só lhes posso louvar a fé. E, acima de tudo, o que tenho a dizer é que não tenho qualquer moral para criticar o bom povo português apenas porque sou bastante diferente da maioria deles. Por isso quando criei este blogue chamei-lhe como lhe chamei, já então gostava de estar no cimo da montanha a apreciar a desgraça que grassava no vale... Assim como se poderia chamar "alone in the island", e então imaginar-me-ia numa ilha distante a ver a desgraça no continente. Mas estou cá no meio, voto diferente de vós, maioria, admiro as nossas diferenças e tento ser aquele que se contenta em apreciar o espectáculo do mundo...

Está dito mas ainda posso acrescentar umas reflexões. O PAN elegeu um deputado: óptimo! Foi das minhas poucas alegrias de ontem. É pena só ter sido um, quando há mais 229 lugares que estão ocupados pelos mesmos de sempre. Ainda assim, há dois partidos que por não terem ainda experimentado o poder merecem esta ressalva. De resto, das 16 cruzes possíveis (nem o Totobola tem tantas linhas...), curiosamente só agora reparei na força da palavra cruzes mas avancemos, 11 não merecem ser alternativa às alternativas que o povo pede; curioso... Claro que por exemplo, havia um partido que achava imensamente e particularmente redutor (além da coligação vencedora, entenda-se), o PURP (Partido Unido dos Reformados e Pensionistas). Redutor porque o país é muito mais do que reformados e pensionistas, e na verdade acho que a nação precisa de sangue novo... O PURP teve 0,26% dos votos... Os diferentes movimentos de cidadãos, que acho extremamente louváveis (mesmo o PURP, pois prefiro a acção à apatia), não conseguiram captar os votos que mereciam pois lutavam, logo à partida, com forças desiguais. O povo, que tanto se chora e critica os políticos, nomeadamente os carreiristas, gosta de os eleger quando tem o poder de não o fazer. Aqui do alto da montanha vejo nevoeiro no vale mas um céu limpo à altura dos meus olhos... Os pequenos partidos e movimentos de cidadãos (que não são partidos políticos, felizmente) conseguiram mais de 5% dos votos. O meu conselho é que além dos partidos que têm, doravante, lugar no parlamento, que se forme apenas mais um partido (ou movimento), e que se lhe chame Tudo o Resto! Penso que, apesar da feliz excepção PAN, é o modo de alguém diferente entrar no parlamento pelo sufrágio.

Falando dos de sempre (surgiu-me o adjectivo escumalha mas vou escusar-me a usá-lo), e começando pelos da ressalva, a CDU teve mais um deputado do que da última vez e perdeu, segundo os entendidos, e o BE teve uma estrondosa vitória e passou a terceira força política (depois da coligação e PS). PAN, eles quando lá chegaram nem meia dúzia eram... A coligação perdeu a maioria e venceu as eleições e o PS perdeu as eleições e ganhou deputados. Há sempre muitas maneiras de ver a mesma questão...

Aguardo cenas dos próximos capítulos pois sem uma maioria absoluta talvez seja difícil governar mas com este presidente da república tudo é possível, como se tem visto...

(Um parêntesis para dizer que o Vilhena deixa saudades...)

E por falar em República, foi implantada há 105 anos mas parece que já não é importante esse facto pois, primeiro, deixou de ser feriado e agora o presidente da mesma fez saber que nem a comemorará... Como Republicano que sou, e nesta República onde vivo, aqui no cimo da montanha é feriado e esta é a minha comemoração.


P. S. (post scriptum, para não haver dúvidas): a República apresenta-se com as mamas descobertas e talvez por isso não faltem mamões desde que aqui chegou; se a foto fosse mais recente, veríamos como desgraçada está a República, mais sugada que a puta que os pariu!

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

ENTREVISTA - Solange Campos, Baixista das Bellenden Ker (e também dos Subic Bay, 5 Caminhos, e muitos outros projectos)

Solange Campos, é para mim um grande prazer poder contar com esta entrevista no meu blogue. Já nos conhecemos há uns anos, partindo dum mal-entendido, na verdade, quando alguém confundiu Vialonga com Valongo... Vialonga, a 300 Km de Valongo, é uma freguesia do concelho que está agora na moda, Vila Franca de Xira, devido ao surto de Legionella, infelizmente. No entanto, esta entrevista vai debruçar-se no inesperado regresso aos palcos das Bellenden Ker, uma banda que, pessoalmente, admiro bastante. Depois da entrevista ao Daniel, dos Jed Dickens, com quem já partilhaste o palco, continuo a escavar no enorme mundo da música. Seis anos após o nascimento das Belenden Ker, e 15 dias depois da espectacular "ressurreição", aqui ficará o teu testemunho!


HIGH ON THE MOUNTAIN:
Vamos começar com uma questão actual e pertinente: tens tomado banho? [cliquem aqui para perceberem a questão e saber mais sobre o surto de Legionella]

Solange Campos: Ahah! Claro que sim. Disseram várias vezes para evitar o duche por causa da inalação de vapores. Comecei a ter algumas precauções mas nunca deixei de tomar banho, embora essa fosse a minha preocupação principal assim que soube da existência da bactéria no concelho onde moro.


HOTM:
Conheces alguém que tenha sido afectado? Os números começam a ser preocupantes...

SC: Não procurei saber... Recentemente faleceu uma pessoa minha conhecida de uma forma inesperada e ainda hoje estou um bocado sensível no que diz respeito a más notícias...


HOTM:
Mudaste os teus hábitos? Sentes alguma tensão no ar, as pessoas estão preocupadas?

SC: Claro! Está toda a gente com medo e extremamente preocupada. Soube-se recentemente que se vai abrir um inquérito a uma das fábricas que supostamente foi a causadora desta catástrofe ambiental mas ninguém sabe propriamente qual e se a propagação da bactéria está realmente controlada. No fim-de-semana passado, o meu pai, que está a morar em Peniche, tinha vindo a Vialonga visitar-me mas, assim que soube, regressou logo a Peniche. A água continua com muito cloro por precaução... Por isso, tenho bebido água das garrafas. :p


HOTM:
Passando agora para a nossa "doença da música" (com certeza que te lembras do spot publicitário do Blitz, antes da mudança de sexo)... Penso sempre em ti como baixista mas é algo redutor. Que diferentes comprimidos (instrumentos musicais) tocas (tomas)?

SC: Ainda hoje uma menina perguntou-me isso. :P O instrumento que tenho mais tocado tem sido o baixo eléctrico mas o instrumento que aprendi a tocar na escola de música e no conservatório é o clarinete. Acompanho as minhas aulas de Música com a guitarra clássica mas só arranho uns acordes. :) Tentei aprender contrabaixo mas não atino com o arco. :P


HOTM:
Destes, qual o teu favorito?

SC: Baixo eléctrico, claro! :)



HOTM:
Tens sido sempre baixista nas bandas rock (assim como em outros projectos). Nunca pensaste em ir para a guitarra, por exemplo?

SC: Não, nunca. Eu gosto de sons graves e adoro ouvir um bom baixo nas bandas. Para os ouvidos de uma pessoa normal, quando ouve uma banda que não tem baixo sente sempre falta de algo e, facilmente, desmotiva-se da música. Muitas pessoas não imaginam o quão é importante um baixo na banda.


HOTM:
E o quão desvalorizado é... Ainda há dias, inesperadamente (pelo menos para mim), as Bellenden Ker [cliquem aqui para a página do Facebook] regressaram do mundo dos mortos num concerto de Halloween (como escrevi na entrevista anterior). De quem partiu a ideia?

SC: Essa ideia partiu da Marta LeFay [vocalista e guitarrista]. O Zé, namorado da Marta e baixista dos Dollar Lama [Facebook aqui], era (e é) amigo do Sérgio, vocalista dos Dr. Bifes e os Psicopratas [Facebook], e o Sérgio ficou a conhecer a Marta e as Bellenden Ker através dele. O último concerto que as Bellenden Ker deram foi organizado pelo Sérgio com inúmeras bandas, incluindo os Dr. Bifes e os Psicopratas, com uma participação especial das Bellenden Ker numa música deles - "Barco do Aborto" [link para o vídeo no youtube]. Isto foi em 31 de outubro de 2011, nos Nirvana Studios.
No Verão deste ano, a Marta entra em contacto comigo e com a Margarida [guitarrista] para voltarmos a fazer o mesmo este ano. O Sérgio organizou de novo um conjunto de concertos no dia 31 de Outubro (Halloween) deste ano, com a participação das Bellenden Ker em concerto e na música deles (a meio do concerto dos Dr. Bifes e os Psicopratas).



HOTM:
Como foi possível este regresso? A Marta está nas Anarchicks [página do Facebook], e isso retirar-lhe-á tempo para um possível regresso das Bellenden Ker, mas trouxe a Catarina [baterista das Anarchicks] para a bateria...

SC: Foi um reunion show. Não sei se a Marta e a Margarida estão interessadas em continuar com a banda. Desde o dia 31 de Outubro que não tive mais contacto com elas. Como sabes, a Vânia, a baterista original das Bellenden Ker, saiu no final de Fevereiro de 2011 e, desde então, foi sempre um suplício para arranjar uma boa baterista. Como não conseguimos, pedi ao meu amigo e excelente músico André Silva para nos acompanhar. Ele foi espectacular e acompanhou-nos até ao final da banda. Neste momento, como bom músico que é e muito requisitado, não teve disponibilidade para fazer o concerto connosco, e como a Catarina mostrou-se interessada em embarcar nesta aventura avançámos! E foi muito bom. Conheci uma excelente baterista. :) Felizmente, graças às Rockalady [link para o Facebook], já conheço mais bateristas do sexo feminino que são excelentes músicos. :)


HOTM:
Como disseste, geralmente há dificuldade em encontrar bateristas (e também baixistas). Já mudaram de baterista algumas vezes... Foi essencialmente isso que levou a esta paragem da banda, a dificuldade em encontrar baterista?

SC: Na realidade, penso que isso desmotivou muito o pessoal da banda. A Marta era o génio que trazia as ideias e comigo e com a Vânia montávamos músicas num abrir e fechar de olhos. E era tudo tão mágico e funcionávamos tão bem as três. São coisas que nunca se esquecem. A Margarida apareceu mais tarde e chegou a fazer connosco a música espetacular onde fazemos a troca de instrumentos (El Mariachi and Miss Moustache in the Garage), o que trouxe riqueza e alegria às músicas.
No final, estávamos bem com o André mas penso que a Marta desmotivou-se com esta procura de baterista e queria fazer outras coisas a nível musical.


HOTM:
Este evento terá sequência ou as Bellenden Ker acabaram com este concerto?

SC: Não sei... depende da vontade da Marta e da Margarida. Percebi que a Catarina gostava de continuar (e eu também).


HOTM:
Também espero pela vontade delas! Há algum concerto que recordes com particular saudade? Algum que te marcou mais? Com as Bellenden ker ou outro projecto...

SC: Das Bellenden Ker... o primeiro que demos no Bacalhoeiro... foi mágico! :)



HOTM:
Recentemente, as Anarchicks ganharam um prémio em Espanha [aqui a notícia da Blitz]. Achas que as Bellenden Ker tiveram o reconhecimento que mereciam?

SC: Eu sou suspeita mas vou ser muito directa: acho que não. Teve reconhecimento por ti, que foste sempre muito querido para a banda, e por alguns amigos... por mais ninguém. Acho estranho na SAPO aparecer uma notícia sobre as Anarchicks e quando falam da Marta dizem que ela foi a vocalista da banda carismática Bellenden Ker [aqui encontram o artigo em causa]. Se foi carismática, porque é que fomos tão mal tratadas no Musicbox, Santiago Alquimista e afins? Porque é que nenhuma editora pegou na banda?


HOTM:
Perguntas pertinentes, de facto. E obrigado pela parte que me toca. Sempre vos adjectivaram como as L7 Portuguesas, ou como as Babes in Toyland Portuguesas(este até se adequará mais pelo cenário de bonecas que coloria o vosso palco). Já os Blind Zero eram os Pearl Jam Portugueses, por exemplo. Por que temos esta necessidade de catalogar as bandas nacionais como "Banda-americana-de-estilo-semelhante Portugueses"?

SC: Eu penso que temos essa necessidade para localizar um pouco a sonoridade da banda. E não é mentira... as nossas influências vêm praticamente de bandas que se ouvem desde as décadas de 80/90 dos EUA.


HOTM:
As bandas 100% femininas não abundam, é um facto. Porquê?

SC: A ver o lançamento da biografia do Victor Gomes dos Gatos Negros no Sabotage [notícia no Diário de Notícias], conheci a baterista dos Dirty Coal Train [Facebook da banda], a Helena, e ela disse-me que, ao contrário de Portugal, no Brasil existem muitas bandas femininas. Será que é por ser um país pequeno em que muita rapariga prefere cantar em vez de tocar instrumentos musicais? Não sei...


HOTM:
Mais uma boa questão... Vocês tinham alguma mensagem feminista, lutavam pela igualdade de direitos ou simplesmente eram amigas que gostavam de rock e queriam fazer o vosso som?

SC: Nunca definimos nada relativamente a lutas ou a causas. Juntámo-nos e fizemos o que fizemos somente pela música e pelo prazer que nos dá tocá-la. :)


HOTM:
Sentias que, por vezes, a audiência estaria mais interessada em vocês por serem mulheres do que pela vossa música? Tanto pelo lado de "Será que elas conseguem?" ou pelo lado mais "voyeurista", digamos...

SC: Depende das pessoas. Existe um pouco de tudo no público... Uma coisa é certa: nunca quisemos mostrar o "bonito" e "belo", tanto nas músicas como na imagem... Se foram pessoas assistir por sermos "gajas", possivelmente assustaram-se connosco devido à nossa imagem e música! eheh.


HOTM:
Já tocaste em bandas all female e bandas mistas. É muito diferente o ambiente nos ensaios? A dedicação à banda? Ou esta questão nem sequer faz sentido?

SC: De uma forma geral, as bandas, femininas ou mistas, comportam-se da mesma maneira nos ensaios... Só modificará um pouco as piadas (ou não, ahahah... Isto ficará no segredo dos deuses! :P). A dedicação à banda... penso que isso não tenha nada a ver com o sexo mas sim com a própria pessoa.


HOTM:
Já estiveste em diferentes projectos musicais. Queres destacar algum?

SC: Queria destacar 3: primeiro os Subic Bay [Facebook da banda], banda de originais onde toco, que tem um som extremamente agradável e que aconselho a todos a conhecerem a ouvirem. Há músicas disponíveis no Facebook e vamos fazer o lançamento de um EP! :) ; os 5 Caminhos [Facebook aqui], uma banda de Música Portuguesa com uma sonoridade extremamente agradável com guitarras acústicas, flauta transversal e percussões; e as Rockalady, banda feminina que, para além de apresentar versões bem executadas e músicos a alto nível, têm uns originais fantásticos!



HOTM:
Actualmente, em que projectos te desdobras?

SC: Actualmente, nestes 3 que mencionei. :) Tenho um projecto em acústico com a minha amiga Ana Lapa, as Keep it Calm, mas está parado.


HOTM:
Tens algum projecto musical em mente, num futuro próximo?

SC: Continuar com estes. ;)


HOTM:
Que te falta fazer na música? E por que ainda não o fizeste?

SC: Falta compor e saber improvisar no baixo. :P Ainda não me dediquei a essas coisas porque sou preguiçosa. :p


HOTM:
Preguiçosa, com tantos projectos!? E achas que é possível viver da música em Portugal? Sem ser os Xutos, por exemplo...

SC: Fiz uma vez, há alguns anos atrás, essa pergunta ao Jorge Bruto dos Capitão Fantasma [clicar para o Facebook da banda] e ele disse-me que sim, mas que muitos músicos vivem mal... Pessoalmente, conheço quem consiga viver mas não se vive desafogadamente... E, neste momento, também é um mercado muito limitado...



HOTM:
Estamos em crise (dizem...). Geralmente a cultura é quem sofre primeiro com os cortes orçamentais. Por que é que se deve apostar na cultura?

SC: O que é que um povo faz sem cultura? Nada. Penso que Portugal ainda não percebeu a importância que a cultura tem para o povo.


HOTM:
Sem dúvida... Os cortes são transversais a diversos sectores fundamentais da nossa sociedade. És professora de Música. Como vês os cortes na Educação e este periclitante início de ano lectivo? Há alguma relação?

SC: Claro que sim! Quiseram colocar mais tarde os professores por causa dos ordenados! E ninguém me convence do contrário... O problema é que isso deu barraca, e das grandes. Penso que a própria prova de conhecimentos que servia para limitar as candidaturas dos professores foi um fiasco para eles porque 85% dos professores passaram na prova.


HOTM:
Em particular, qual a situação do ensino musical em Portugal?

SC: Está uma desgraça. Em grande parte das escolas de 2.º e 3.º ciclos, só têm Educação Musical no 2.º ciclo (5.º e 6.º anos) e, com o aumento de número de alunos por turma, foram reduzindo também o número de colocações. Eu não estou colocada e estou muito longe de ficar (infelizmente). Para além disso, as "Atividades de Enriquecimento Curricular" em grande parte das escolas primárias trocaram a Música por Expressões. Penso que, de uma forma geral, existe uma grande desvalorização pelo ensino musical em Portugal.


HOTM:
Infelizmente. Tenho conversado com diferentes Professores, de diferentes disciplinas, que declaram uma diminuição na qualidade dos alunos, no seu empenho, nos seus conhecimentos. Apesar da tua carreira estar ainda no início, sentes isto?

SC: Não está bem no início... Já cá cantam com 8 anos de ensino. :) Sim, os alunos são o reflexo da sociedade. Hoje em dia ninguém valoriza um professor. Muitos pais encaram-no como aquele que quer prejudicar o seu filho e depois ouvimos e vemos coisas horríveis. Para além disso, vivemos numa sociedade que impôs o facilitismo em tudo. Confesso que, como professora, continuo a remar contra a maré...


HOTM:
Em particular no ensino da música, há alunos com "bom ouvido"?

SC: Geralmente, em cada turma, existe sempre um ou dois alunos que se destacam por terem "bom ouvido". :)


HOTM:
Os teus alunos sabiam, ou sabem, que és baixista em bandas rock?

SC: Sim, sabem. :) Eu não escondo isso. Alguns até pensam que eu sou uma pessoa famosa! ehehe.


HOTM:
Se não fosses famosa, achas que te entrevistava!? :)
E encararam o facto com naturalidade e não ligaram muito, ficaram admirados ou pediram-te um autógrafo?

SC: Ficam admirados mas eu nunca prolongo muito a conversa por causa da aula. :)



HOTM:
Tenho a certeza que o teu gosto pela música e os diferentes projectos musicais que abraçaste fazem de ti uma docente melhor. Mas achas que a nossa sociedade Portuguesa, ou parte desta, ainda olha de modo desconfiado para os músicos? Para os artistas, no geral?

SC: Sim, é possível... Quando eu conto a alguém, fora do meio musical, que dou concertos, a pessoa pensa logo em drogas e maluquices, embora não costumem comentar mas eu sei. :p O que as pessoas não sabem é que eu posso ser maluca em palco mas, fora do palco, até sou uma pessoa certinha. :p Sobre a sobrevivência, se disseres a alguém que vives de alguma forma de arte, irão logo pensar que és um miserável e que, na realidade, estás a viver dos rendimentos dos teus pais.


HOTM:
Penso que parte desta desconfiança parte do estereótipo de que os músicos são uns bêbados e uns drogados, indo directo ao assunto e como já referiste. Ainda há uns meses, um estudo inglês [link para a notícia] concluía que os músicos têm uma menor esperança média de vida do que a restante população (a par de tantos outros estudos com conclusões semelhantes). Pensas que há uma maior apetência para o consumo de substâncias psicotrópicas pela classe ou, por outro lado, uma vida psicologicamente desgastante, com muitas viagens em pouco tempo e grandes incertezas quando ao rendimento do amanhã têm também uma grande influência?

SC: Eu acho que nesse estudo tiveram mais em conta o facto do músico consumir drogas e álcool. Não te vou mentir... há muita gente que o faz mas também conheço quem não o faça e ninguém te obriga, só fazes porque queres.


HOTM:
Dando exemplos concretos: Zé Leonel (56 anos), Rui Rocker (49 anos), João Ribas (48 anos)... Ultimamente, temos perdido alguns nomes importantes do Rock Português, infelizmente. Alguns deles sei que eram mesmo teus amigos. Independentemente do estilo de vida que levavam, e das causas da morte, o truísmo confirma-se e desapareceram cedo demais... Foram personalidades importantíssimas que influenciaram imensos músicos. Achas que a sociedade reconheceu o seu trabalho e importância?

SC: Não. Definitivamente não. Grandes músicos e importantíssimos na história do rock português e nem sequer tiveram direito, em nenhum noticiário, a uma referência ao seu falecimento... é uma vergonha. O único dos três músicos com quem tive ligação foi com o Zé Leonel [primeiro vocalista dos Xutos e Pontapés]. Ainda ontem eu e o baterista de Subic Bay, o Pedro Rodrigues, estávamos a falar das músicas dos Ex-Votos [página do Facebook]. O Ribas [fundador e vocalista dos "Censurados" e "Tara Perdida", entre outros projectos] apoiava sempre as bandas nacionais. Nos concertos de punk/rock que eu via na Casa de Lafões, a casa costumava estar vazia mas o Ribas marcava sempre a sua presença e essa imagem não me sai da cabeça. Chegou a ver, inclusivé, Bellenden Ker. O Rui Rocker [fundador e guitarrista dos "Crise Total" e guitarrista dos "Asfixia"] não conheci pessoalmente, com muita pena minha... Mas tanto ele como o Zé Leonel ficarão na história da música do rock português por terem dado o último concerto já numa fase bem avançada da doença... dias depois faleceram. Só por isso, mereciam uma grande homenagem em todos os canais. Espero que um dia escrevas um livro sobre o rock português e fales sobre isto tudo. :)

HOTM:
Pretendo escrever tal livro e fazer justiça a essas e outras personalidades esquecidas pela nossa sociedade. Já no Brasil, por exemplo, o Gilberto Gil, cuja fama chegou pela música, chegou a Ministro da Cultura. Como Ministros da Cultura ligados à música, tivemos recentemente a pianista Gabriela Canavilhas, e penso ser caso único. Actualmente, nem Ministério da Cultura há... Achas que alguma vez teremos um músico como Gilberto Gil, mais conhecido pelo grande público e não tão erudito, como Ministro da Cultura em Portugal?

SC: Não prevejo num futuro próximo voltar a existir sequer Ministério da Cultura... teriam de se modificar demasiadas mentalidades. E se voltasse a existir, sei que quem vai para lá não faz aquilo que quer... por isso duvido muito que vá para lá um músico.



HOTM:
Se te dessem a escolher, e se, uma vez lá, pudesses mesmo mudar algo de acordo com as tuas ideias, preferias ser Ministra da Cultura ou Ministra da Educação?

SC: Ministra de Educação. Teria que dar alguma educação às pessoas para começarem a apreciar cultura. ;)


HOTM:
Óptima resposta! Estamos quase a acabar. Não é difícil descortinar algumas bandas que farão parte das tuas preferências musicais. Sei que chegaste mesmo a falar com o Mark Arm, vocalista dos Mudhoney, aquando dum concerto da banda em Portugal... Esta última pergunta é tão ridícula que se torna engraçada, e tu vais entendê-la particularmente bem. Como já perguntei ao Daniel (e ele safou-se bem): o grunge está morto!?

SC: Ahahah! O grunge continuará vivo enquanto houver pessoas a senti-lo. :)


HOTM:
Muito obrigado pela entrevista. Se quiseres deixar algum comentário final, está à vontade; no meu blogue não há limites editoriais!

SC: Queria só agradecer-te por me teres escolhido para uma entrevista com temas tão abrangentes. Fizeste bem o trabalho de casa. ;)